Saturday, September 09, 2006

Por que o Brasil não cresce?

Segue artigo publicado hoje, dia 08/09/2006, no jornal O estado de S. Paulo, p.2, de autoria dos economistas José Roberto Mendonça de Barros, Luiz Carlos Mendonça de Barros e Paulo Pereira Miguel.

Não nos iludamos. O país está em rota de colisão com o caos.

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Por que o Brasil não cresce?

José Roberto Mendonça de Barros, Luiz Carlos Mendonça de Barros e Paulo Pereira Miguel

O resultado decepcionante do produto interno bruto (PIB) do segundotrimestre plantou a semente da dúvida a respeito das condições decrescimento da economia brasileira, mesmo sob condições aparentementefavoráveis. Não apenas o Brasil está muito atrás dos outros países"emergentes", mas estamos passando a vergonha de crescer menos que aEuropa e o Japão. Os mais otimistas - e certamente o governo, a portasfechadas - estão tentando achar explicações para tão fraco desempenho.Afinal, estão dadas muitas das condições consideradas necessárias paraum crescimento maior e mais consistente que o dos últimos anos. Sãoelas, entre outras: um forte ajuste das contas externas, a queda dorisco País, a convergência da inflação para as metas, alguma redução nataxa de juros real - embora ainda alta sob qualquer critério - e amanutenção de um superávit primário suficiente para estabilizar arelação dívida/PIB. Há ainda uma combinação de estímulos conjunturaisimportantes, que em outras situações seria suficiente para retirar aeconomia da letargia: o crescimento mundial acima de 4% ao ano e aacelerada expansão do crédito e dos gastos públicos.

Poisbem, mesmo com todos estes fatores, num alinhamento astral incomum, oPaís cresceu apenas 1,7% nos últimos quatro trimestres. Não apenas ocrescimento é baixo, mas sua composição é ruim, baseada em consumo eaumento insustentável de gastos públicos. Os investimentos apenaspatinam, há anos abaixo de 20% do PIB, nível insuficiente para ocrescimento sustentado. E, para piorar, mais recentemente o setorexterno deixou de jogar a favor e já contribui negativamente para ocrescimento, tendo retirado quase um ponto porcentual do PIB noprimeiro semestre deste ano, com riscos de prejudicar ainda mais daquipara a frente.

Por que o Brasil não cresce? O ponto de partidada explicação é a simples constatação de que o País não investe osuficiente. Há problemas sérios tanto na política macroeconômica quantonos mal compreendidos "fatores microeconômicos".

No que serefere à questão macroeconômica, não há dúvida que a combinação atualdas políticas fiscal, monetária e cambial está errada e resulta embaixo crescimento. Os gastos públicos estão na raiz da questão: suacontínua expansão compromete a eficiência da economia, pois, financiadapor uma alta e crescente carga tributária, contribui para os jurosaltos e o câmbio valorizado. O resultado é a crescente asfixia doinvestimento privado. O único componente da demanda agregada que estáem expansão continuada é o consumo, público e privado. Todos os outrosestão sofrendo as conseqüências da tentativa do governo de criar ummoto-contínuo baseado em transferências públicas: juros e impostosaltos impedem o crescimento do investimento e a valorização cambialcompromete lentamente a contribuição das exportações líquidas. Oconsumo tem crescido 4% ao ano, mas o conjunto da economia pareceincapaz de crescer mais de 3% ao ano: o PIB está "vazando" cada vezmais para o exterior. Nem o PIB nem o emprego acompanham a expansão doconsumo, até porque os setores mais prejudicados pelo câmbio valorizadosão justamente os mais intensivos em mão-de-obra. Os dados do IBGEmostram que a produção nestes setores já está em queda. Isso não é umfator da natureza, mas resultado de escolhas equivocadas por parte dosresponsáveis pela política econômica. A redução da restrição externa daeconomia brasileira nos últimos anos dá algum fôlego a este modelo, masos custos já estão aparecendo de forma inequívoca.

A respeitodas questões microeconômicas, é evidente que o ambiente não éfavorável. Aí os fatores são muitos, desde os problemas históricos debaixa qualidade institucional, vergonhoso nível educacional e lentidãojurídica, mas também há o insuficiente comprometimento do governo comum ambiente saudável para o investimento. Basta ver o sucateamento dasagências regulatórias, a tolerância com a desordem no campo, averdadeira via-crúcis para aprovação de projetos nos órgãos de defesaambiental e os obstáculos ideológicos à inovação tecnológica. Nãoiremos muito longe com tamanha hostilidade ao que deveria ser objeto deestímulo. Há ainda questões difusas, mas igualmente importantes. Acarga tributária alta resultante da voracidade do Estado impõe, até porquestões de sobrevivência dos que pagam impostos, um crescenteemaranhado de regras, exceções, isenções, pacotes disto e daquilo. Aquilométrica legislação do PIS/Cofins é emblemática. Quanto custa tudoisso para as empresas? Quanto há de corrupção no sistema apenas porconta de regras conflitantes? Deve-se buscar não um alívio aqui eacolá, mas um corte linear de impostos, principalmente dos que têm ofaturamento como fato gerador. Isso só pode ser feito se houvercontrole dos gastos públicos e é para isso que se deveriam mobilizar asforças da sociedade.

Para encerrar, cabe um alerta. O resultadoda bonança externa foi uma notável melhora nas condições definanciamento externo da economia brasileira, mas não estão sendoconstruídas as condições para um futuro promissor. O mundo certamentevai desacelerar em 2007, principalmente os Estados Unidos. A China temgalgado novos níveis de sofisticação industrial e está competindo compaíses intermediários, como o Brasil, em todos os mercados. Em 2007,não tenhamos dúvidas, tudo o que os chineses não venderem aos EstadosUnidos será direcionado para mercados como o brasileiro. O vazamento dademanda interna para o exterior será então ainda maior.

José Roberto Mendonça de Barros, Luiz Carlos Mendonça de Barros e Paulo Pereira Miguel são economistas.


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