Saturday, November 07, 2009

Os moluscos do Brasil

sábado, 7 de novembro de 2009 | 0:01

Claude Lévi-Strauss descobriu o Brasil. O Brasil é assim mesmo: é descoberto e redescoberto continuamente, desde 1500. Se os portugueses, em 1500, descobriram o Brasil seguindo a corrente marinha, Claude Lévi-Strauss, quatro séculos mais tarde, em 1939, descobriu-o seguindo a linha telegráfica do marechal Rondon, em Mato Grosso. Ali, depois de se afastar da “escória de Cuiabá”, ele encontrou uma série de aldeias de índios em estado bruto, intocados pelos costumes do homem branco. Em particular, os nambiquaras.

Num de seus ensaios antropológicos, Claude Lévi-Strauss observou a indigência cultural dos nambiquaras e comparou-os a “uma raça gigante de formigas”. Eles se caracterizavam por ter orelhas grandes, por embriagar-se com “chicha”, por tocar uma música de uma nota só, por entreter-se cuspindo no rosto uns dos outros e por ignorar o estojo peniano devido à sua apatia sexual. Antes de Claude Lévi-Strauss, o geógrafo Edgar Roquette-Pinto já comparara os nambiquaras a “homens da Idade da Pedra”, acrescentando que a “pneumatose intestinal fá-los companheiros desagradáveis”. E o presidente dos Estados Unidos Theodore Roosevelt, que passara por lá em 1914, acompanhado pelo marechal Rondon, dissera que os nambiquaras eram “ingênuos e ignorantes como animais domésticos”.

O contato com os nambiquaras deprimiu Claude Lévi-Strauss. Ele passou a se perguntar: “O que viemos fazer aqui? Com que esperança? Com que finalidade?”. Ele só conseguiu encontrar a resposta alguns anos depois, quando estabeleceu as bases do estruturalismo: “O maior interesse oferecido pelos nambiquaras é que nos defrontamos com uma das formas de organização social e política mais simples que se possam imaginar”. E prosseguiu: “A diferente estrutura do aparelho digestivo de homens, bois e moluscos não indica diferentes funções de seus sistemas digestivos. A função é sempre a mesma, podendo ser mais bem estudada e compreendida em suas formas mais simples, como a de um molusco”.

No Brasil, Claude Lévi-Strauss descobriu o homem reduzido à sua condição de molusco. Perseguido pelo nazismo na II Guerra Mundial, por ser judeu, ele tentou refugiar-se no país, mas Getúlio Vargas, o molusco que naquele tempo presidia o Brasil, simplesmente lhe fechou as portas. Claude Lévi-Strauss morreu na última semana. Setenta anos depois de seu contato com os nambiquaras, seguindo a linha telegráfica do marechal Rondon, nós ainda nos caracterizamos por tocar música de uma nota só, por cuspir no rosto uns dos outros e por sofrer de pneumatose intestinal. Nós ainda temos uma das formas de organização social e política mais simples que se possam imaginar. E nós ainda procuramos responder às mesmas perguntas: o que viemos fazer aqui? Com que esperança? Com que finalidade?

Por Diogo Mainardi

Wednesday, September 09, 2009

Qual foi o critério do papai-presidente para a compra dos caças franceses??!!?

De acordo com reportagem de Virgínia Silveira para o jornal Valor Econômico de hoje, certamente o critério não foi técnico...qual foi o critério, papai-presidente???!!!??

Decisão de Lula foi à revelia da avaliação técnica da FAB



Virgínia Silveira, para o Valor, de São José dos Campos 
09/09/2009


A decisão do governo brasileiro de iniciar uma negociação com os franceses para a compra de 36 caças de combate do modelo Rafale, produzido pela empresa Dassault, foi feita à revelia da Força Aérea Brasileira (FAB), que foi surpreendida pela notícia divulgada na última segunda-feira. "Lula ignorou o relatório da FAB, que levou meses para ser elaborado, e tomou a decisão política, sem base técnica", comentou uma fonte que acompanha de perto o processo.

Na Aeronáutica a informação oficial, divulgada pelo Centro de Comunicação Social da Aeronáutica (Cecomsaer), era de que o processo licitatório dos caças ainda está aberto e que a decisão final só será conhecida entre o final de setembro e início de outubro. A assessoria de imprensa do Ministério da Defesa informou que estava valendo o que foi dito pelo presidente Lula e o ministro de Relações Exteriores, Celso Amorim, mas não confirmou nem desmentiu a escolha da oferta francesa.

Segundo fonte ligada ao processo de seleção dos caças, na última sexta-feira o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Juniti Saito e o presidente da Comissão Coordenadora do Programa Aeronave de Combate (Copac) e coordenador do F-X2, brigadeiro Dirceu Tondolo Noro teriam se reunido com o ministro da Defesa Nelson Jobim e o presidente Lula para falar sobre o conteúdo do relatório técnico da FAB, que não indicava o Rafale como o preferido dos militares.

Um fator preocupante, segundo a fonte, é que além do Rafale ser 40% mais caro que os outros concorrentes, a proposta da Dassault não inclui montagem final e integração de armamentos. "Seria uma negociação à parte, o que encarece ainda mais o valor do contrato, estimado em US$ 4 bilhões", afirma.

Especialistas afirmam ainda que na negociação com a França uma das questões pendentes seria o alto custo das horas de vôo dos caças franceses, o que inviabilizaria sua operação na Força Aérea. O custo operacional do Rafale foi estimado em US$ 16 mil, enquanto o americano F-18, da Boeing, teria um custo de US$ 10 mil e o sueco Gripen, da Saab, de US$ 4,5 mil.

Em relação às propostas de transferência de tecnologia, item em que a aeronave francesa estaria bem à frente dos concorrentes, nos bastidores do setor aeroespacial brasileiro a informação também é diferente. Segundo fonte ligada aos militares, durante a seleção do FX-2, as empresas Embraer, Atech, Mectron e Aeroeletrônica foram convocadas pela aeronáutica para fazer uma avaliação das propostas de parceria feitas pelos concorrentes, principalmente na transferência de tecnologia. De acordo com a fonte, somente a Atech teria colocado o Rafale em primeiro lugar. As demais colocaram o Gripen em primeiro, o F-18 em segundo e em último o Rafale.

Um empresário do setor aeroespacial disse que a forma como a transferência de tecnologia foi colocada no processo de compra dos caças não dá nenhuma garantia efetiva de que será cumprida. "No F-X2 essa transferência fica a critério da empresa contratada. Deveríamos fazer como nos Estados Unidos, onde as compras de defesa sempre são feitas diretamente da empresa nacional, e quando a tecnologia é comprada de fora, existe a obrigação de um percentual mínimo de participação da empresa nacional, que hoje é de 75%".

Procurada, a Embraer também não se manifestou sobre a decisão do governo de negociar a compra dos caças com a Dassault. A empresa deve ser uma das principais beneficiárias do acordo com os franceses, pois o presidente Nicolas Sarkozi, anunciou a intenção de compra de 10 aeronaves KC-390, o cargueiro militar que a Embraer está desenvolvendo para a FAB. Segundo especialistas próximos ao F-X2, a Boeing teria manifestado essa intenção em sua proposta enviada à FAB e o número de unidades a serem compradas pelos americanos supera em muito o anunciado pelos franceses.

A Boeing e a Saab não se manifestarem ontem. Segundo o diretor geral da Gripen Internacional, Bengt Janér, a empresa não recebeu nenhuma informação oficial da FAB e nem do governo a respeito da escolha de um dos concorrentes ao FX-2. A Boeing limitou-se ontem a emitir uma nota por meio da qual informa não ter sido comunicada "nem pela comissão do FX-2 nem pelo governo brasileiro a respeito de qualquer decisão ".

A fabricante americana, que obtém na área de defesa metade da receita anual de US$ 67 bilhões, havia montado uma gigantesca rede de apoio para a negociação. A operação envolveu três departamentos da empresa, num total de 150 pessoas, além de contratos com consultorias brasileiras.

A direção da Boeing estava animada com as chances de seu avião, o Super Hornet, ser escolhido. Enquanto negociava com o governo brasileiro, nos últimos meses, a Boeing assinou termos de compromisso com 25 fabricantes de componentes do Brasil, espalhados entre São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Além disso, sondou diversas empresas, como a pequena Navtec, com 15 funcionários, localizada em Santa Rita do Sapucaí, Sul de Minas Gerais. A Navtec, que surgiu para abastecer a Helibras, foi visitada pela Boeing há mais ou menos dois meses, conta Claile Oppenheimer, um dos sócios. (Colaborou Marli Olmos, de São Paulo)

Monday, August 31, 2009

Comparações entre 1929 e o momento atual

Talvez a história esteja se repetindo:

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Sunday, August 23, 2009

A fama


Ricos menos ricos

Vi uma reportagem no NYT que pode significar um alento para o mundo. Ao que parece, os ricos não vêm ficando mais ricos nos últimos anos. Os gráficos abaixo resumem o argumento:

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O MINISTRO SOUBE E NÃO FEZ PEDIDOS

Mantega obteve informações da ex-secretária da Receita Federal sobre as investigações dos negócios do clã Sarney mas não fez propostas "incabíveis"


Alexandre Oltramari

Celso Junior/AE
SIM Guido disse que pediu a Lina Vieira (à esq.) explicações sobre o vazamento de informações


Existe um terceiro personagem envolvido no caso do suposto encontro entre a ex-secretária da Receita Federal Lina Vieira e a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, no fim do ano passado. É o ministro da Fazenda, Guido Mantega, chefe direto de Lina Vieira nos onze meses em que ela ocupou o cargo e responsável por sua demissão, há um mês, sem nenhuma justificativa pública. Na semana passada, em depoimento ao Senado, a ex-secretária repetiu que foi chamada para uma reunião com a ministra no Palácio do Planalto e lá recebeu um pedido para agilizar as investigações que a Receita Federal fazia sobre os negócios da família Sarney. Não apresentou provas, mas convenceu por listar uma terceira testemunha, pela abundância de detalhes e por demonstrar não ter razões para mentir. O pedido de Dilma foi classificado pela ex-secretária como "incabível". Ela não elaborou. Nem precisava. A oposição interpretou como a tentativa da ministra de interferir em um procedimento oficial com o objetivo de favorecer um aliado político. Dilma negara antes não apenas o teor da conversa, mas a própria existência do encontro.

O caso não se encerra com o depoimento de Lina. Será preciso esclarecer as razões pelas quais, como tudo indica, a ministra cortou caminhos na hierarquia e fez pedidos "incabíveis" a uma secretária da Receita Federal. Uma hipótese a ser investigada é a de que Dilma só teria entrado em ação depois de uma falha no canal natural para obter o efeito desejado pelo Palácio do Planalto – o ministro da Fazenda, Guido Mantega. Descobriu-se agora que esse canal foi acionado, mas sem que se produzissem os resultados esperados. Mantega efetivamente chamou a ex-secretária em seu gabinete e pediu detalhes sobre o caso dos Sarney. O ministro justificou seu interesse sem rodeios, informando a Lina que a investigação estava preocupando o Palácio do Planalto. A secretária fez seu relato e o ministro agradeceu as informações. Mantega encerrou a conversa sem pedir nem sugerir nenhuma ação à secretária Lina. Isso é o que se sabe. Por meio de sua assessoria, o ministro Guido Mantega confirmou o encontro com Lina Vieira. "O ministro quis saber a razão pela qual detalhes da investigação da Receita sobre o filho de Sarney estavam saindo nos jornais. Ele entende que a apuração, coberta por sigilo fiscal, não poderia estar vazando. Foi uma conversa normal entre um chefe e um subordinado sobre um assunto diretamente relacionado às atribuições dele", disse a VEJA o jornalista Ricardo Moraes, assessor de imprensa do ministro. Ele disse que Guido Mantega não se lembra da data da conversa.

Gustavo Miranda/Ag. Globo
NÃO Dilma voltou a negar o encontro em que teria pedido para agilizar a investigação


Aqui, o caso que já era complexo torna-se verdadeiramente confuso. A ex-secretária negou ter tratado desse assunto em encontro com seu superior, Guido Mantega. Quando o senador Tasso Jereissati perguntou se ela havia conversado com Mantega sobre a investigação, Lina respondeu simplesmente: "Não". Como Mantega confirma o encontro e o teor da conversa com Lina, está patente que a ex-secretária mente e que, portanto, pode ter inventado a história sobre a reunião com a ministra Dilma? Uma pessoa próxima à ex-secretária diz que ela omitiu aos senadores seu encontro com o ministro Mantega por uma questão de lealdade. Lina teria visado a proteger o ministro, com quem tem ótimas relações e que foi apontado pelo Planalto como responsável direto pela confusão. O ministro teria "perdido o controle" sobre sua subordinada. Procurada por VEJA, a ex-secretária não retornou as ligações.

Travar em público uma queda de braço de credibilidade com a poderosa ministra Dilma não é uma empreitada que se tome a peito facilmente. Lina ficou tão assustada com a repercussão que cogitou não comparecer ao depoimento ao Senado. Só mudou de ideia depois de receber a garantia de que não seria abandonada à sanha da tropa de choque do governo. Ela contou que foi levada ao encontro com Dilma numa tarde de dezembro passado, em data que não consegue precisar, pelo motorista Warley Soares, da Receita, que confirmou ter feito diversas vezes o percurso. Lina disse que entrou pela garagem do Palácio do Planalto, identificou-se a um segurança e subiu sozinha ao gabinete da ministra, no 4º andar do prédio. Todo esse trajeto é coberto por câmeras de segurança. Esqueça-se a ideia salvadora de que bastaria, então, ver as fitas do mês de dezembro para mostrar quem está mentindo. As fitas são guardadas por apenas trinta dias e depois reutilizadas.


Papai-Presidente para seu partideco: "É PARA SALVAR O SARNEY"

"É PARA SALVAR O SARNEY"

Como foi armada e executada a operação para enquadrar o PT e arquivar
as denúncias contra Sarney em troca do apoio do PMDB a Dilma


Otávio Cabral

Ailton Freitas/O Globo
NO FINAL, TODOS SAÍRAM FELIZES
O peemedebista Romero Jucá e Renan Calheiros comemoraram o arquivamento das acusações contra o senador José Sarney


A operação que salvou o presidente do Senado, José Sarney, começou no fim da tarde da quarta-feira 12 de agosto. O presidente Lula convocou para uma conversa seu chefe de gabinete, Gilberto Carvalho, e o presidente do PT, Ricardo Berzoini. Relatou aos dois um recado que havia recebido na véspera dos senadores José Sarney e Renan Calheiros. A dupla avisara que, caso o PT se negasse a usar sua força para engavetar os processos contra o presidente do Senado, o PMDB abandonaria a campanha presidencial de Dilma Rousseff. "Não vamos aceitar jogo de cena do PT", disse Calheiros. Preocupado, Lula determinou a Berzoini e Carvalho que levassem a seguinte ordem ao senador Aloizio Mercadante, líder do partido no Senado: "É para salvar o Sarney".

Embora tenha sido exitosa, a missão não era simples. Os senadores do PT estavam divididos entre a lealdade ao presidente e a própria sobrevivência política. A maioria não tinha nenhum problema de consciência em absolver Sarney, mas temia se desgastar junto à opinião pública. Afinal, cerca de 70% dos brasileiros, segundo pesquisa do instituto Datafolha, querem vê-lo fora do comando do Senado. Contrariar a opinião pública, faltando pouco mais de um ano para as eleições, é sempre uma temeridade. O foco de resistência era o Conselho de Ética. Dois dos três representantes do partido, Delcídio Amaral e Ideli Salvatti, não queriam votar publicamente pela absolvição de Sarney, embora sejam ferrenhos aliados do senador. Estavam receosos do reflexo que isso poderia ter na campanha no ano que vem. O único senador totalmente à vontade para defender Sarney era o amazonense João Pedro. Suplente, sem voto e, portanto, sem motivo para ter vergonha, João Pedro é um antigo companheiro de pescaria de Lula e faz qualquer coisa para agradar-lhe. Os dois votos petistas levariam Sarney ao cadafalso.

Celso Junior/AE
Tarcisio Mattos/Tempo Editorial
Cristiano Mariz
VOTO ENVERGONHADO
Delcídio tapou o rosto e disse "sim" a Sarney fora do microfone
ELE MANDA, ELA FAZ
Ideli não queria se desgastar, mas teve de cumprir a ordem
UM LÍDER PARA A HISTÓRIA
Mercadante "renunciou à renúncia" e "revogou o irrevogável"


Para contornar o problema, o presidente do PT, Ricardo Berzoini, sugeriu a substituição do senador Delcídio Amaral pelo suplente, Roberto Cavalcanti, do PRB da Paraíba (voto pró-Sarney). Ideli Salvatti se absteria na hora de verbalizar sua decisão e todos sairiam felizes. Havia, porém, outro problema. O líder Aloizio Mercadante já tinha dito publicamente que não patrocinaria nenhuma manobra para salvar Sarney. Cabe apenas ao líder substituir os membros das comissões. Ficou acertado que, para evitar o constrangimento, Mercadante faria uma "viagem" ao Uruguai por uns dias. Ele topou a armação, mas, depois de pensar bem, voltou atrás. Na tarde da sexta-feira 14, ligou para Gilberto Carvalho para avisar que desmarcara a "viagem". Mercadante concluiu que a manobra o desgastaria ainda mais perante o eleitorado. "Não vou mais. Na segunda-feira estarei no Congresso." A quebra do acordo irritou o presidente Lula e o PT, que sentiu na decisão de Mercadante cheiro de traição e de uma indesejada rebelião no partido.

No fim de semana, Lula resolveu cuidar pessoalmente do trabalho de alinhamento dos senadores petistas, escalando uma tropa de choque para convencê-los da importância da missão. E que tropa. José Dirceu, o "capitão" do time de Lula que hoje é réu sob a acusação de chefiar a quadrilha do mensalão, naquele tom que lhe é característico conforme o nível de servilismo ou resistência do interlocutor, falou aos colegas sobre a necessidade de salvar Sarney para ter o PMDB ao lado de Dilma em 2010. Seu principal adversário dentro do PT, o ministro Tarso Genro, da Justiça, também ajudou na operação – usando a ameaça como argumento. A mando de Lula, Genro procurou o senador Paulo Paim, seu conterrâneo do Rio Grande do Sul, e falou que ele só seria candidato à reeleição se não fizesse nenhuma manifestação contra Sarney. Paim se calou.

O senador Mercadante, já sem controle da bancada que acreditava liderar, passou a protagonizar um vexame atrás do outro. Depois de desistir da farsa uruguaia, ainda ouviu um sermão de Ricardo Berzoini e Gilberto Carvalho. Os dois disseram ao senador que o governo não aceitava sua posição dúbia e que ele deveria substituir, sim, Delcídio Amaral e Ideli Salvatti no Conselho de Ética. Mercadante, então, ameaçou pela primeira vez renunciar à liderança do PT no Senado. Embora ninguém tenha pedido que ficasse, ele não consumou a ameaça, advertido por Berzoini de que ainda poderia ficar sem legenda para disputar a eleição paulista de 2010. O passo seguinte foi chamar Delcídio e Ideli para uma conversa. "Ser governo tem ônus e bônus. Agora é a hora do ônus", explicou Berzoini. A dupla aceitou a missão. Na noite de terça-feira, Berzoini foi à casa da governadora do Maranhão, Roseana Sarney, e, na presença do senador, informou: "Vamos cumprir integralmente o acordo".

No rol de humilhações, a cúpula do PT produziu mais uma para enquadrar Mercadante. Exigiu que ele lesse uma nota do partido orientando os senadores a votar pela absolvição de Sarney. Quem acabou lendo a nota foi o suplente João Pedro. Delcídio e Ideli passaram a sessão calados e cabisbaixos, com o rosto enfiado em jornais e revistas, para fugir das câmeras de televisão. Na hora de votar, disseram "sim" para Sarney fora dos microfones. Mercadante anunciou que renunciaria à liderança do partido. O senador chegou a marcar a hora do discurso da renúncia, a qual anunciou como "irrevogável". Mas, depois de uma conversa com Lula, a coragem passou. Ele então fez uma das mais convolutas piruetas político-semânticas de que se tem notícia. Mercadante conseguiu o feito digno de guru indiano de "renunciar à renúncia" e "revogar o irrevogável". Continuará liderando a tropa petista sobre a qual ele já não exerce liderança alguma. Em sentido inverso, a senadora Marina Silva cumpriu o que anunciou e abandonou o PT. O mesmo ocorreu com o senador Flávio Arns, que nem anúncio prévio fez. Ao se transformar em um partido em que um Renan vale mais do que uma Marina Silva, o PT perdeu o pouco de brilho que sua estrela ainda emanava. 

"Lula não fará seu sucessor"

VEJA 1 - “LULA NÃO FARÁ SEU SUCESSOR”

sábado, 22 de agosto de 2009 | 5:51

Carlos Augusto Montenegro é um dos mais experientes analistas do cenário político nacional. Presidente do Ibope, empresa que virou sinônimo de pesquisa de opinião pública no Brasil, ele acompanhou com lupa todas as eleições realizadas no país desde a volta à democracia, em 1985. Agora, faltando pouco mais de um ano para a sucessão presidencial, Montenegro faz uma análise que o consagrará se acertar. Se errar? Bem, dará às pessoas o direito de igualarem seu ofício às brumas da especulação. Em entrevista ao editor Alexandre Oltramari, Montenegro aposta que o governo, apesar da imensa popularidade do presidente Lula, não conseguirá fazer o sucessor - no caso, a ministra Dilma Rousseff. Também afirma que o PT está em processo de decomposição.

O que os acontecimentos da semana passada revelaram sobre o PT?
Que o partido deu um passo a mais na direção de seu fim. O PT passou vinte anos dizendo que era sério, que era ético, que trabalhava pelo Brasil de uma maneira diferente dos outros partidos. O mensalão minou todo o apelo que o PT havia acumulado em sua história. Ali acabou o diferencial. Ali acabou o charme. Todas as suas lideranças foram destruí-das. Estrelas como José Dirceu, Luiz Gushiken e Antonio Palocci se apagaram. Eu não diria que o partido está extinto, mas está caminhando para isso.
(…)
Ao contrário do que muita gente acredita, o senhor aposta que Lula, mesmo com toda a popularidade, não conseguirá eleger o sucessor.
Uma coisa é ele participar diretamente de uma eleição. Outra, bem diferente, é tentar transferir popularidade a alguém. Sem o surgimento de novas lideranças no PT e com a derrocada de seus principais quadros, o presidente se empenhou em criar um candidato, que é a Dilma Rousseff. Mas isso ocorreu de maneira muito artificial. Ela nunca disputou uma eleição, não tem carisma, jogo de cintura nem simpatia. Aliás, carisma não se ensina. É intransferível. “Mãe do PAC”, convenhamos, não é sequer uma boa sacada. As pessoas não entendem o que isso significa. Era melhor ter chamado a Dilma de “filha do Lula”.

ÉTICOS PROFISSIONAIS, CORRUPÇÃO E POLÍTICA

Continua Reinaldo Azevedo. Meu caro, você tem um aliado aqui.

"Vejo que alguns analistas políticos lastimam o que chamam a “decadência” do PT ou a “perda de seus valores éticos”. E fico cá me perguntando, cheio de certezas: não terá sido sempre assim? É que o partido não tinha tido a chance de demonstrar todo o seu talento. As coisas, as pessoas e as instituições não se tornam aquilo que essencialmente não são. Se o PT não tivesse a intimidade fundadora com a corrupção, não teria se deixando corromper. É simples. Tanto a pobreza quanto a riqueza podem gerar o santo e o bandido. A diferença que faz um e outro não está no meio, mas no indivíduo, em suas escolhas. O PT não se transformou nisso que vemos porque o sistema político o forçou a tanto. Dado o sistema político, ele escolheu ser assim.

Pessoas que participaram da fundação da legenda e que a deixaram faz tempo — alguns rompendo pela esquerda; outras, pela direta; outras ainda ficaram apenas enfaradas — relatam que, também em matéria partidária, o menino é o pai do homem; o PT inicial definiu o PT que aí está. Não há contradição nenhuma. Quem quiser maiores esclarecimentos deve procurar saber por que Cesar Benjamin e Paulo de Tarso Venceslau romperam com o partido. Não tenho a menor intimidade ideológica com eles. Mas o que relatam indica que houve apenas uma mudança de escala. Quando menino, o PT tinha uma amoralidade de menino; adulto, tem uma amoralidade de adulto. “Mas é só ele?”, logo pergunta um petista tentando dividir o fardo.

Não! A corrupção nasce junto com a política. Nem por isso tem de ser considerada um dado da paisagem. Tentar transgredir as regras do jogo faz parte do jogo. Mas é preciso punir aquele que for malsucedido, aquele que for pego. E quem escapa? Bem, o que a gente não sabe, os cofres públicos sentem, é claro. Mas, se não o sabemos, não há como punir. O mal maior está no malfeito descoberto que resta impune. A impunidade desmoraliza as instituições e rebaixa o padrão de exigências dos cidadãos, tornando-os mais tolerantes com o intolerável.

Por que o PT é um desastre ético para o Brasil? Estaria ele obrigado a ser mais correto do que os outros? Não tem ele também, como refletiu certa feita uma bruxa disfarçada de pensadora de esquerda — ou seja, uma bruxa disfarçada de bruxa —, o direito de fazer das suas, a exemplo das outras legendas? Pra começo de conversa, ninguém tem o direito de fazer a coisa errada. Ocorre que o PT é a única legenda fundada sob a bandeira da “ética na política” — transformando numa espécie de horizonte utópico o que deve ser apenas um meio, um instrumento, da ação política. Atuar politicamente para tornar o mundo “ético” costuma ser a vocação de ditadores. Quem entendia do riscado já percebia ali uma das sementes do que viria.

Partidos políticos dignos desse nome têm projetos de poder e se obrigam a pensar a sociedade no seu conjunto. Não são curas de aldeia, não são bedéis de colégio, não são catecúmenos. Ser ético não é um de seus objetivos, mas construir uma usina pode ser. Ser ético não é um de seus objetivos, mas erguer escolas pode ser. Ser ético não é um de seus objetivos, mas implementar programas sociais pode ser. A ética atravessa verticalmente todos esses temas. É preciso ser ético construindo usinas, escolas e programas sociais. É preciso ser ético para tomar um sorvete — ou você ainda acaba roubando o sorveteiro.

Quando o PT assumiu como bandeira “a ética na política”, ele a seqüestrou. Tomando o lema como horizonte, passou a justificar todas as suas ações em nome daquele devir, daquela utopia. Não demorou, e logo começou o esforço para justificar o que não parecia compatível com a sua pureza. Se alguém se torna o dono da ética, tudo o que ele fizer estará imantado por essa vocação. Se o dono da ética é também seu monopolista, está feito: pode mentir, pode roubar, pode matar. A alegoria perfeita para esse comportamento, não tem jeito, é mesmo A Revolução dos Bichos, de George Orwell. Assim agiram os porcos depois que fizeram a sua revolução contra os fazendeiros bípedes. Com o tempo, os novos donos do poder perceberam que era preciso celebrar a paz com os Sarneys — e, para tanto, foi preciso até eliminar alguns adversários internos.

O PT ainda está convencido de que é dono da ética e que pode usá-la como escudo. O senador Aloizio Mercadante deu a prova inconteste do que digo. Cheio de indignação, em nome da ética, anunciou seu descontentamento com a ordem de Lula para salvar José Sarney e disse que renunciaria à liderança. Horas depois, subia à tribuna de um Senado quase vazio — dos petistas, restou apenas um para ouvir o seu trololó — e anunciava o dia do “Fico”. Começou com “aquilo” roxo e terminou com “aquilo” amarelo… Nos dois casos, Mercadante estava sendo “ético”.

Eu não tenho grandes ilusões sobre esse partido ou aquele. O que espero é que se organizem para fazer o que tem de ser feito, empregando os tais meios éticos, uma obrigação. Acontece que há na imprensa, não só na brasileira, e em certos setores bem-pensantes a vocação para a mistificação e a mitificação.  Vejo o que se dá agora com Marina Silva.

Os criadores de mitos tentam nos fazer crer que ela rompeu com o PT porque, afinal, já não suportava aquela “ética”. É mesmo? Quer dizer que ela suportou bem o caso Waldomiro, o mensalão e o dossiê dos aloprados, mas não resistiu à MP da Amazônia? Podia conviver com a ética que abrigava aquelas práticas e achou que só o suposto desatino do governo na área ambiental é que o tornou impróprio? Posso até achar, como acho, que Marina cria problemas para o PT. Mas não vou aplaudi-la por isso.

Eu não tenho a menor paciência para éticos profissionais. Cedo ou tarde, acabam, a exemplo de Lula, aderindo à Teoria da Bravata."

O imprescindível

No blog de Reinaldo Azevedo:

"O senador Aloizio Mercadante, com o seu verbo frouxo, diz que ficou na liderança do PT porque Lula o considera “imprescindível”. Creio que sim.

É “imprescindível” para Lula haver alguém como Mercadante, que consegue até mesmo tornar o “irrevogável” revogável se Lula pedir ou mandar. É disso mesmo que precisa o presidente; tais pessoas, para ele, são “imprescindíveis”. Dispensáveis são aquelas que resistiriam, em nome de princípios, a uma coisa ou outra. É por isso que escrevi que, no PT, Lula é a instância superior, e todo o resto é inferior.

Em seu Twitter, Mercadante — que, definitivamente, perdeu o senso de ridículo — diz ter errado ao chamar de “irrevogável” a sua decisão de renunciar à liderança. Sem dúvida! O único que pode decidir o que é e o que não é “irrevogável” para Mercadante, mesmo em questões de consciência, é seu chefe político.

Isso quer dizer que Mercadante é e não é senador por São Paulo. Ele é um senador do Lula e por Lula. Se o outro mandar, pode votar contra os interesses do Estado."

Saturday, August 22, 2009

Infográfico

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A economia mundial voltou ao caminho do crescimento?

A Bolsa brasileira sobe 90% no ano. Revistas de negócio mais uma vez afirmam que vivemos uma Era de Ouro; o canal Bloomberg é a estrela hollywoodiana da cartilha de investimentos. Podemos ser tão otimistas com a recuperação econômica global a ponto de esquecermos, mais uma vez, os fundamentos?

Me parece mais um momento de recuperação dentro de um período maior de depressão do que o contrário. Digo depressão e não recessão, pois a situação atual é muito mais séria do que muitos pensam. A diferença entre depressão e recessão é a espiral deflacionária, que desenvolvo abaixo. 

A chave para entendermos a atual crise econômica mundial é o conceito de "recessão do balanço patrimonial". O economista-chefe do Nomura, Richard Koo, lançou um livro no ano passado que explica muito bem o que é uma recessão de balanço. Esse tipo de recessão é o mesmo tipo que explica a Grande Depressão dos EUA nos anos 30 e o Japão durante sua década perdida (os anos 90 do século passado).

Resumidamente, a recessão de balanço acontece quando os preços dos ativos caem muito e as dívidas assumidas pelas pessoas para adquirir estes ativos se tornam muito maiores do que estes mesmos ativos valem. Assim, a pessoa fica com um patrimônio líquido reduzido. Volta-se para a redução de suas dívidas. E aí entra a espiral: a recessão leva a uma deflação de preços, desalavancagem financeira e, no fim, depressão.

Portanto, a oferta de dinheiro na praça, solução defendida por 11 entre 10 economistas, simplesmente não vai resolver a situação, porque a demanda por dinheiro é e vai continuar baixa! Para que tomar dinheiro emprestado se quero reduzir as minhas dívidas?

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Uma derivada dessa ação é o excesso de capacidade produtiva que temos hoje no mundo. As empresas esperam a demanda atingir o atual nível de oferta - o que provavelmente acontecerá só daqui a muitos anos. Consequência dois: inflação baixa.
Redução de dívida com inflação baixa significa baixo crescimento do consumo. Como se vê no gráfico abaixo, o crescimento ano-ano das vendas no varejo dos EUA pode ser comparado aos piores momentos da história econômica daquele país:

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A alternativa para apressar a recuperação do crescimento do consumo seria acelerar os "defaults" das instituições - um cenário tipo Grande Depressão 2. Nas duas realidades teremos um período de baixo crescimento pela frente.

O pau-mandado do papai-presidente

 

Ao terminar seu aguardado pronunciamento da tribuna do Senado, ontem, o senador Aloizio Mercadante pediu desculpas à 

família, que lhe pedira que deixasse a liderança do Partido dos Trabalhadores (PT), por não ter resistido ao apelo do presidente Lula para que violentasse a própria consciência e ficasse. A razão da pretendida renúncia, como deixara claro, era 

sua profunda discordância em relação à posição assumida por seu partido, que levou seus três representantes no Conselho de Ética a votar contra o desarquivamento das 11 representações contra o presidente da Casa, José Sarney, por quebra de decoro parlamentar. Mercadante queria que pelo menos uma delas – a referente aos atos secretos – viesse a ser discutida e julgada no Conselho. Derrotado, ia anunciar sua renúncia na quinta-feira – alegadamente para manter-se fiel a suas próprias convicções e princípios éticos – quando foi chamado a Palácio pelo presidente Lula e com ele teve uma conversa que durou 5 horas, estendendo-se até a 1 hora. 


“Não tenho como dizer não a Lula”, disse o senador, quando da tribuna leu o apelo do presidente, em carta enviada após a reunião palaciana. Nela o presidente afirmava que a continuação de Mercadante na liderança era “imprescindível”, “fundamental”. Talvez Lula julgue imprescindível e fundamental contar com líderes partidários com espinhas suficientemente 

flexíveis a ponto de não deixar que convicções pessoais possam se sobrepor às estratégias político-eleitorais por ele (Lula) adotadas, tendo em vista a continuidade do próprio poder. É verdade que, por essa atitude, o senador Mercadante corre o risco de ser julgado apenas um pau-mandado, até porque, como confessou em seu patético discurso, em toda a sua carreira 

jamais resistiu aos apelos do primeiro-companheiro, já tendo desistido de importante bolsa de estudos no exterior, assumido candidaturas indesejadas e não previstas e coisas do tipo. Desde os primórdios das carreiras políticas de ambos, o metalúrgico já comandava o professor e economista – apesar de Mercadante se dizer “petista antes de o PT existir”. 


Aliás, reportando-se aos inícios de sua trajetória petista, quando se dedicou exclusivamente ao ideal de “mudar o Brasil”, acabando com suas injustiças sociais e mazelas políticas, Mercadante garantiu que nunca pleiteou cargos públicos e sempre defendeu a moralidade administrativa. Também não se esqueceu de mencionar que os “atos secretos” ferem claramente dispositivos da Constituição e que o PT cometeu muitos erros políticos na busca de alianças – referindo-se obviamente ao 

PMDB –, sendo essas as razões que, enfim, justificariam suas diferenças em relação à orientação seguida por seu partido. Mas deu como motivações maiores para contrariar suas próprias convicções e permanecer na liderança, primeiro, os triunfos econômicos e sociais do governo Lula e, segundo, a necessidade de mobilizar a militância do partido e fazê-lo 

voltar a seu idealismo (ético) original. Só que, ao se submeter, mais uma vez, à vontade – e aos projetos pessoais – de seu velho companheiro e líder Luiz Inácio Lula da Silva, esqueceu que o Brasil que ele queria mudar foi submetido por Lula a um projeto de poder em que são peças-chave José Sarney, Fernando Collor de Mello e Renan Calheiros – pois esta é a força 

política que interage com a vontade política hegemônica do presidente, para levar o Partido dos Trabalhadores para onde bem entende. 


Há de se reconhecer que o presidente Lula conseguiu realizar todos os objetivos que traçara, desde a eclosão da crise no Senado. Conseguiu preservar na presidência do Senado um político contra o qual pesa uma carga inédita de acusações, suspeitas e indícios – levantados não por uma imprensa “nazista”, mas pela Polícia Federal do seu governo. Conseguiu 

manter a aliança com o PMDB, o aliado mais poderoso – principalmente pelos minutos que controla no horário eleitoral gratuito no rádio e televisão – para a realização de seu projeto de fazer sua sucessora a ministra Dilma Rousseff. E conseguiu enquadrar os dissidentes do Partido dos Trabalhadores, impedindo – como já o fizera ao tempo do mensalão – que os pruri- 

dos éticos de alguns levassem o partido a uma séria cisão interna. Continua unido, embora desfigurado.


Até agora, a vitória é completa. Resta saber se tão despudorados atentados à decência e aos bons costumes não levarão os eleitores a ensinar a Lula e seus companheiros o que foi a vitória de Pirro.