Saturday, October 23, 2010

Dilma Rousseff e Gilberto Carvalho dão as ordens para a produção de dossiês - parte 2

Intrigas de estado

Diálogos entre autoridades revelam que o Ministério da Justiça, o mais antigo e tradicional da República, recebeu e rechaçou pedidos de produção de dossiês contra adversários

Gustavo Ribeiro

RELAÇÕES PERIGOSAS: As conversas às quais VEJA teve acesso mostram que o braço direito do presidente Lula, Gilberto Carvalho, e a candidata à Presidência Dilma Rousseff tentaram usar o Ministério da Justiça para executar “tarefas absurdas”

RELAÇÕES PERIGOSAS: As conversas às quais VEJA teve acesso mostram que o braço direito do presidente Lula, Gilberto Carvalho, e a candidata à Presidência Dilma Rousseff tentaram usar o Ministério da Justiça para executar “tarefas absurdas” (Montagem Sambaphoto/Folhapress)

Estamos a menos de uma semana das eleições e, como escreveu o correspondente Stuart Grudgings, da agência noticiosa Reuters, políticos e jornalistas correrão às bancas mais próximas para ver se será esta a edição de VEJA que vai abalar a liderança de Dilma Rousseff nas pesquisas eleitorais. Embora a análise do funcionário da Reuters demonstre um total desconhecimento do que seja jornalismo, atividade em que os fatos fazem as notícias e não o contrário, ele acertou em seu diagnóstico a respeito da ansiedade que as capas de VEJA provocam no meio político. A reportagem que se vai ler a seguir não foge à regra. Ela revela, talvez da maneira mais clara até hoje, o tipo de governo produzido pela mentalidade petista de se apossar do estado, aparelhá-lo e usá-lo em seu benefício partidário. VEJA já havia demonstrado nas reportagens “O polvo no poder” e “A alegria do polvo” como a Casa Civil fora transformada em um balcão de negócios, em que maços de dinheiro vivo apareciam nas gavetas de escritórios a poucos metros da sala do presidente da República. A presente reportagem relata as tentativas ousadas de petistas de alto coturno de conspurcar um dos mais antigos e venerandos ministérios da República, o da Justiça.

Jose Cruz/Abril

Pedro Abramovay, atual secretário nacional de Justiça, em conversa com seu antecessor, Romeu Tuma Júnior

“Não aguento mais receber pedidos da Dilma e do Gilberto Carvalho para fazer dossiês. (...) Eu quase fui preso como um dos aloprados.”
Pedro Abramovay, atual secretário nacional de Justiça, em conversa com seu antecessor, Romeu Tuma Júnior

É conhecido o desprezo que o PT nutre pelas instituições republicanas, mas o que se tentou no Ministério da Justiça, criado em 1822 por dom Pedro I, ultrapassa todas as fronteiras da decência. Em quase 200 anos de história, o ministério foi chefiado por homens da estatura de Rui Barbosa, Tancredo Neves e quatro futuros presidentes da República. O PT viu na tradicional instituição apenas mais um aparelho a serviço de seu projeto de poder. Como ensina Franklin Martins, ministro da Supressão da Verdade, “às favas com a ética” quando ela interfere nos interesses políticos e partidários dos atuais donos do poder. VEJA teve acesso a conversas entre autoridades da pasta que revelam a dimensão do desprezo petista pelas instituições. Os diálogos mostram essas autoridades incomodadas com a natureza dos pedidos que vinham recebendo do Palácio do Planalto. Pelo que é falado, não se pode deduzir que o Ministério da Justiça, ao qual se subordina a Polícia Federal, cedeu integralmente às descabidas investidas palacianas. “Não aguento mais receber pedidos da Dilma e do Gilberto Carvalho para fazer dossiês. (...) Eu quase fui preso como um dos aloprados”, disse Pedro Abramovay, secretário nacional de Justiça, em conversa com seu antecessor, Romeu Tuma Júnior. Abramovay é considerado um servidor público exemplar, um “diamante da República”, como a ele se referiu um ex-ministro. Aos 30 anos, chegou ao Ministério da Justiça no início do governo Lula pelas mãos do ex-ministro Márcio Thomaz Bastos. A frase dele pode confirmar essa boa reputação, caso sua “canseira” tenha se limitado a receber pedidos e não a atender a eles. De toda forma, deveria ter denunciado as ordens impertinentes e nada republicanas de “produzir dossiês”.

Mesmo um alto funcionário com excelente imagem não pode ficar ao mesmo tempo com a esmola e o santo. Em algumas passagens da conversa, Abramovay se mostra assustado diante das pressões externas e diz que pensa em deixar o governo. Não deixou. Existem momentos em que é preciso escolher. Antes de chegar ao ministério, ele trabalhou no gabinete da ex-prefeita Marta Suplicy, na liderança do PT no Senado e com o senador Aloizio Mercadante. Vem dessa etapa da carreira a explicação para a parte da frase em que ele diz “quase fui preso como um dos aloprados”. A frase nos leva de volta à campanha eleitoral de 2006, quando petistas foram presos em um hotel ao tentar comprar um dossiê falso contra José Serra. A seu interlocutor, Abramovay sugere ter participado do episódio e se arrependido, a ponto de temer pedidos semelhantes vindos agora do Palácio do Planalto. Ele disse que quase foi preso na época do escândalo e que, por isso, teve de se esconder para evitar problemas. “Deu ‘bolo’ a história do dossiê”, comenta. Em pelo menos três ocasiões, Abramovay afirma que não está disposto a novamente agir de forma oficiosa. E justificou: “...os caras são irresponsáveis”.

Dida Sampaio/AE

Romeu Tuma Junior, ex-secretário nacional de Justiça

“O Pedro reclamou várias vezes que estava preocupado com as missões que recebia do Planalto. Ele realmente me disse que recebia pedidos da Dilma e do Gilberto para levantar coisas contra quem atravessava o caminho do governo.”
Romeu Tuma Junior, ex-secretário nacional de Justiça

Os diálogos aos quais a reportagem teve acesso foram gravados legalmente e periciados para afastar a hipótese de manipulação. As ordens emanam do coração do governo — do chefe de gabinete da Presidência, Gilberto Carvalho, e da candidata a presidente, Dilma Rousseff. A conversa mais longa durou cinquenta minutos e aconteceu em janeiro deste ano, no gabinete do então secretário nacional de Justiça e antecessor de Abramovay no cargo, Romeu Tuma Júnior. Os interlocutores discutem a sucessão do ex-ministro Tarso Genro. Ao comentar sobre o próprio futuro, Abramovay revela o desejo de trabalhar na ONU. Em tom de desabafo, o advogado afirmava que já não conseguia conviver com a pressão. Segundo ele, a situação só ia piorar com a nomeação para o cargo de Luiz Paulo Barreto, então secretário executivo, pela falta de força política do novo ministro, funcionário de carreira da pasta, em que também angariou excelente reputação. “Isso (o cargo de ministro) é maior que o Luiz Paulo. (...) Agora eles vão pedir... para mim... pedir para a Polícia (Federal)”, desabafou.

Procurado por VEJA, Abramovay disse: “Nunca recebi pedido algum para fazer dossiês, nunca participei de nenhum suposto grupo de inteligência da campanha da candidata Dilma Rousseff e nunca tive de me esconder — ao contrário, desde 2003 sempre exerci funções públicas”. Romeu Tuma Júnior, seu interlocutor, porém, confirmou integralmente o teor das conversas: “O Pedro reclamou várias vezes que estava preocupado com as missões que recebia do Planalto. Ele me disse que recebia pedidos de Dilma e do Gilberto para levantar coisas contra quem atravessava o caminho do governo”. Acrescentou Tuma: “Há um jogo pesado de interesses escusos. Para atingir determinados alvos, lança-se mão, inclusive, de métodos ilegais de investigação. Ou você faz o que lhe é pedido sem questionar, ou passa a ser perseguido. Foi o que aconteceu comigo”, afirma o ex-secretário, que deixou a pasta em junho, depois que vieram a público denúncias de que teria relacionamento com a máfia chinesa. Tuma Júnior atribui a investigação contra si — formalmente arquivada por falta de provas — a uma tentativa de intimidação por parte de pessoas que tiveram seus interesses contrariados. Ele não quis revelar quais seriam esses interesses: “Mas posso assegurar que está tudo devidamente documentado”.

Sergio Lima/Folhapress

Para o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, o diretor da PF, Luiz Fernando Corrêa (direita), se valeu do aparato policial para monitorar autoridades. O ministro suspeitou que ele próprio houvesse sido vítima de grampos ilegais e que até o presidente Lula tivesse sido constrangido por Corrêa

Para o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, o diretor da PF, Luiz Fernando Corrêa (à dir.), se valeu do aparato policial para monitorar autoridades. O ministro suspeitou que ele próprio houvesse sido vítima de grampos ilegais e que até o presidente Lula tivesse sido constrangido por Corrêa


O clima de desconfiança no Ministério da Justiça contaminou até o mais alto escalão. A certa altura das conversas, o chefe da pasta, Luiz Paulo Barreto, manifesta suspeita de que seu subordinado Luiz Fernando Corrêa, diretor-geral da Polícia Federal, o espione. Em inúmeras ocasiões, Barreto revelou a seus assessores não ter ascendência sobre Corrêa. O ministro chega a expressar em voz alta sua desconfiança de que o diretor da PF tem tanto poder que se dá ao luxo de decidir sobre inquéritos envolvendo pessoas da antessala do presidente da República. Um desses casos é relatado por Barreto em conversa no seu próprio gabinete, ocorrida em meados de maio. À sua chefe de gabinete, Gláucia de Paula, Barreto fala sobre o possível indiciamento de Gilberto Carvalho, braço direito do presidente Lula. Em 2008, a PF interceptou telefonemas em que o chefe de gabinete da Presidência conversava com o advogado Luiz Eduardo Greenhalgh, um dos investigados na Operação Satiagraha, que prendeu o banqueiro Daniel Dantas.

Fotomontagem

Em um dos diálogos, o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto (esquerda), sua chefe de gabinete, Gláucia de Paula, e o então secretário nacional de Justiça Romeu Tuma Júnior conversam sobre a origem do poder do diretor da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa — que teria conseguido, entre outras coisas, evitar o indiciamento de Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do presidente Lula.

Em um dos diálogos, o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto (à esq.), sua chefe de gabinete, Gláucia de Paula, e o então secretário nacional de Justiça Romeu Tuma Júnior conversam sobre a origem do poder do diretor da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa — que teria conseguido, entre outras coisas, evitar o indiciamento de Gilberto Carvalho, chefe de gabinete do presidente Lula.

Gláucia de Paula
O Gilberto (Carvalho, chefe de gabinete da Presidência) foi indiciado?
Ministro Luiz Paulo Barreto
O processo foi travado. Deu m... (...) O negócio do grampo. O Luiz Fernando falou pra não se preocupar.
Gláucia de Paula
Tem certeza disso?
Ministro Luiz Paulo Barreto
O ministro Márcio (Thomaz Bastos) que me contou isso. O Gilberto (Carvalho) me contou isso.
Tuma
Esse cara tem alguma coisa, não é possível (...).


O ministro, que diz ter tido conhecimento do indiciamento pelo próprio Gilberto Carvalho, revela que o diretor da PF promoveu uma encenação para iludi-lo, numa manobra para mostrar que seu poder emanava de fora da hierarquia do Ministério da Justiça. A conversa toma um rumo inesperado. Um dos interlocutores fica curioso para saber a fonte real de poder de Luiz Fernando, que lhe dá cobertura até para desafiar seu próprio chefe sem temor de represálias. “Ele deve ter alguma coisa...”, afirma. Procurado, Luiz Paulo Barreto informou que não comentaria nada antes de ter acesso ao áudio da conversa. Gilberto Carvalho negou que já tenha feito algum pedido a Pedro Abramovay, a mesma resposta de Dilma Rousseff. As conversas e sua vinda a público funcionam como o poder de limpeza da luz do sol sobre os porões. Elas são reveladoras da triste realidade vivida por instituições respeitadas quando passam a ser aparelhadas por integrantes de um projeto de poder.

Fotomontagem

O quartel-general da pré-campanha de Dilma Rousseff foi usado para espionar adversários. A mando de Luiz Lanzetta (à esq.), o ex-jornalista Amaury Ribeiro Jr. (abaixo) comprou a quebra do sigilo fiscal do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge (à dir.), e de aliados de José Serra

O quartel-general da pré-campanha de Dilma Rousseff foi usado para espionar adversários. A mando de Luiz Lanzetta (à esq.), o ex-jornalista Amaury Ribeiro Jr. (abaixo) comprou a quebra do sigilo fiscal do vice-presidente do PSDB, Eduardo Jorge (à dir.), e de aliados de José Serra


Outra demonstração disso surgiu na semana passada, quando a Polícia Federal forneceu a mais recente prova de quanto pode ser perniciosa a simbiose entre partido e governo. Na quarta-feira, depois de revelado que o ex-jornalista Amaury Ribeiro Jr., integrante do “grupo de inteligência” da campanha de Dilma, foi o responsável pela violação do sigilo fiscal de Eduardo Jorge e de outros integrantes do PSDB, o militante petista Lula, atualmente ocupando a Presidência da República, anunciou ao país que a PF faria revelações sobre o caso — antegozando o fato de que um delegado, devidamente brifado sobre o que deveria dizer, jogaria suspeitas das patifarias de Amaury Ribeiro sobre os ombros do PSDB. Mais uma vez, a feitiçaria dos petistas resultou em um tiro no próprio pé. Nunca aprendem que, uma vez aberta a caixa de Pandora, os fantasmas escapam e voam sem controle.

Em junho passado, VEJA revelou que o comitê de campanha de Dilma Rousseff arregimentou um grupo de arapongas para espionar o candidato José Serra, seus familiares e amigos. A tropa começou os trabalhos com o que considerava um grande trunfo, um dossiê intitulado “Operação Caribe”, produzido por Amaury e que narrava supostas transações financeiras de pessoas ligadas ao PSDB. As únicas peças do dossiê fajuto que não podiam ser lidas no Google haviam sido obtidas de forma preguiçosa e venal, compradas de bandidos com acesso a funcionários da Receita Federal — e pagas com dinheiro vivo. Os dados fiscais violados serviram de subsídio para o tal relatório que circulou no comitê de campanha. Como “previu” o militante petista que ora ocupa a Presidência da República, horas depois de sua entrevista apareceram as tais “novidades”. Um delegado anunciou que, com a identificação de Amaury, o caso estava encerrado, já que o ex-jornalista, ao violar o sigilo, ainda era funcionário do jornalO Estado de Minas, portanto não haveria nenhuma ligação com a campanha do PT. O delegado Alessandro Moretti foi o escolhido apenas para comunicar à nação as graves revelações obtidas pelo trabalho policial — formalmente ele não participou do inquérito. A lealdade no caso era mais vital do que o profissionalismo policial. Número dois na diretoria de Inteligência da PF, Moretti é produto direto do aparelhamento na Polícia Federal.

Perícia

Dilma Rousseff e Gilberto Carvalho dão as ordens para a produção de dossiês


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Saturday, April 17, 2010

Em um mês, três obras do PAC no Amazonas apresentam problemas

Marcelo de Moraes - O Estado de S.Paulo

Em menos de um mês, três obras em portos fluviais do Amazonas, incluídas no Programa de Aceleração de Crescimento, deram problemas. Um deles, o de Humaitá, foi entregue pela ainda ministra Dilma Rousseff, no dia 25 de março. Duas semanas depois, a correnteza e o impacto das toras que descem o Rio Madeira arrastaram parte de sua estrutura.

Não foi o único incidente envolvendo obras desse tipo na região. Quatro dias depois, foi a vez de ocorrer problemas no terminal fluvial de Manaquiri, a 64 quilômetros de Manaus, quando uma passarela rachou justamente quando seria feita a ligação entre a balsa flutuante da ponte com a rampa de concreto.

Plataforma do porto de Itacoatiara, que cedeu no dia 23 de março deste ano. Foto: Nara Mendes/AE

O primeiro problema com terminais hidroviários do PAC tinha acontecido no dia 23 de março, na cidade de Itacoatiara, a 177 quilômetros da capital amazonense. Nesse caso, a plataforma do porto cedeu durante a passagem de uma pá mecânica (uma espécie de trator), pesando 18 toneladas. O terminal, que está passando por reformas, deveria suportar um peso de 50 toneladas.

As obras nesses terminais fluviais têm sido capitalizadas politicamente no Estado. Amiga e aliada do então ministro dos Transportes Alfredo Nascimento, que será candidato ao governo do Amazonas, Dilma fez questão de prestigiar a inauguração da obra do PAC em Humaitá. Foi uma de suas últimas participações em eventos desse tipo antes de deixar a Casa Civil para concorrer à sucessão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

As obras do porto de Humaitá têm um custo estimado em R$ 15 milhões. As de Itacoatiara somam R$ 7 milhões, enquanto as de Manaquiri somam R$ 4,9 milhões.

Explicações

Responsável pela maioria dos recursos federais repassados para essas obras, o Ministério dos Transportes reconheceu a ocorrência de problemas nos terminais fluviais. Mas procurou minimizar seus efeitos. Em relação ao porto de Humaitá, inaugurado por Dilma, a assessoria de comunicação do ministério informou que o terminal fluvial "ainda não está aberto para operação pública, na expectativa da liberação final de órgãos oficiais".

A assessoria, porém, confirmou que "a última ponte e o flutuante principal do complexo foram deslocados, por força de acúmulos de troncos e outros objetos levados pela correnteza do rio Madeira".

Poitas. Segundo o ministério, as poitas de sustentação (um instrumento usado por pequenos barcos para fundear no lugar de âncoras) cederam. "Mas as pontes de acesso à estrutura principal não afundaram, por serem flutuantes", garante a assessoria.

"O Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) informa que a situação foi prontamente restabelecida, com acréscimo de novas poitas, com capacidade para suportar correnteza com velocidade de até 10 nós", assegurou o ministério.

Incidente

Em relação ao porto de Manaquiri, o ministério reconheceu que houve "o registro de um incidente operacional, dia 12". "A empresa contratada para construção do porto errou na operação de cabeamento, para liberação das pontes, durante a subida do leito. Os flutuantes permaneceram na mesma altura, segurados pelos cabos, mas liberados imediatamente após a ocorrência", diz a assessoria. No caso de Itacoatiara, o governo do Amazonas está verificando o que fez a plataforma ceder após a passagem de um trator por ela.

Os abusos de poder de Lula

JOSÉ ÁLVARO MOISÉS - O Estado de S.Paulo

Existe relação entre a posição do governo quanto aos perseguidos políticos de Cuba, os desrespeitos do presidente à legislação na campanha eleitoral e a irresponsabilidade com que ele e outras autoridades públicas reagiram às catástrofes e mais de 250 mortes no Rio de Janeiro e em Niterói?

Nas últimas duas décadas o Brasil reconquistou o regime democrático. Não está em questão se a democracia existe, mas a sua qualidade. Os escândalos de corrupção, as tentativas de cerceamento da liberdade de imprensa e o discutível desempenho do Congresso Nacional mostram que a consolidação da democracia não depende apenas de votar e escolher governos.

A democracia é mais do que isso. Ela se baseia na soberania popular para ser efetiva e depende de que as instituições que previnem o abuso de poder e asseguram o equilíbrio entre Executivo, Legislativo e Judiciário funcionem a contento, sem sofrer ameaças veladas ou não de governantes ou de seus competidores. Não basta ter uma Constituição para garantir o império da lei, a vigência de direitos individuais e sociais e a obrigação dos governantes de prestar contas de suas ações e se responsabilizarem por elas.

O papel dos líderes que se dizem democratas é essencial, pois eles não são apenas mandatários de cargos administrativos, têm de dar o exemplo de correção e probidade no trato dos interesses públicos e, diante das incertezas próprias da democracia, têm o dever de orientar e educar os cidadãos para respeitarem a lei e as decisões coletivas, conviver com o pluralismo político e aceitar que, além da maioria, as minorias também têm direitos - princípios que distinguem o regime democrático de suas alternativas.

Atualmente, essas qualidades de liderança estão em falta no Brasil. A despeito de seus méritos, como manter a estabilidade econômica e ampliar as políticas sociais de seu antecessor, Lula virou as costas para valores democráticos fundamentais, revelando ao final de dois mandatos outros aspectos de sua personalidade política. Supõe às vezes estar acima da lei, burla o princípio de igualdade política e mistifica a crença dos eleitores de baixa renda, condenados a baixos níveis de educação, por isso mesmo menos críticos diante de quem usa o prestígio da Presidência para fazer crer que é o único autor dos avanços recentes do País.

No caso de Cuba, em vez de reconhecerem a opressão aos perseguidos políticos do regime e a ofensa a direitos assegurados pela Carta da ONU, Lula e os seus se solidarizaram com os dirigentes cubanos que arbitram autoritariamente sobre a vida dos perseguidos do regime, debochando do sentido político da greve de fome como forma de protesto. Lula desqualificou a sua própria experiência na luta contra o regime militar e igualou essa luta à ação de criminosos comuns; ofendeu milhares de perseguidos e torturados no mundo inteiro e gente de seu governo que sofreu perseguição no passado. O silêncio ou a abstenção do governo brasileiro em votações na ONU destinadas a condenar o desrespeito aos direitos humanos na Coreia do Norte, no Irã, no Sudão, no Congo e no Sri Lanka, ou a tolerância à destruição da democracia na Venezuela de Chávez, iluminam outros lados do quadro.

Nesses casos, Lula deixou de lado a posição majoritária dos brasileiros a favor da democracia verificada em pesquisas de opinião. Na campanha por sua candidata à Presidência, em flagrante desrespeito às leis eleitorais, tem se utilizado dos benefícios do cargo há mais de dois anos para fraudar o princípio de igualdade política. Multado pela Justiça Eleitoral, desqualificou as penalidades, convidou o público a debochar das regras e deu a entender que, diferente dos outros cidadãos, despreza as exigências da legislação. A repercussão negativa o levou a pedir cuidado aos ministros, conclamando-os a serem republicanos. Mas o embuste é flagrante - senão a ignorância de Lula quanto ao significado do conceito de res-pública -,pois antes e depois da advertência não se controlou em eventos e inaugurações oficiais, publicizando a sua candidata.

A indiferença de Lula diante dos mecanismos de controle dos Poderes republicanos é evidente. Seu governo desconhece o conceito de accountability, como ficou evidente no caso do mensalão e dos desmandos de José Sarney. Mais dramática ainda foi sua atitude diante das catástrofes no Rio de Janeiro e em Niterói. Primeiro, apelou aos céus diante das chuvas; depois, anunciou a liberação de R$ 200 milhões para ações de emergência e, finalmente, quando veio a público o relatório do Tribunal de Contas da União (TCU) mostrando que o Ministério da Integração Nacional liberou, em dois anos, mais de 64% de recursos para emergências à Bahia do ex-ministro Geddel Vieira Lima, e menos de 1% para o Rio de Janeiro, Lula chamou o relatório de "leviano".

Não é a primeira vez que ele desqualifica as decisões do TCU. Em mais de uma ocasião, quando gastos indevidos foram identificados pelo tribunal, o presidente se comportou como se não tivesse obrigação de dar explicações ao País. Até agora, nem ele nem seu ex-ministro apresentaram os critérios usados na distribuição dos recursos emergenciais. Ademais, em oito anos de governo, Lula parece não se ter dado conta de que ocupações urbanas de risco não se resolvem com medidas de emergência. Mas, ao qualificar de "levianas" as críticas do tribunal, deu razão a autoridades como o prefeito de Niterói, que, após vários mandatos à frente da cidade, confessou desconhecer os laudos técnicos que condenaram a urbanização do lixão do Morro do Bumba. Lula abusa do poder, rebaixa a qualidade da democracia e, pior, estimula outras autoridades a fazerem o mesmo.

É PROFESSOR DE CIÊNCIA POLÍTICA E DIRETOR DO NÚCLEO DE PESQUISA DE POLÍTICAS PÚBLICAS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Sunday, April 11, 2010

O tribunal implacável da chuva

Cada vez mais documentais, desastres naturais mostram além do clima e da natureza e solapam promessas pretensiosas e politiquismo de boteco

10 de abril de 2010 | 10h 44

Os muitos mortos, desaparecidos e desabrigados das chuvas destes dias no Rio de Janeiro acrescentam mais do que dor aos nossos sentimentos coletivos. Acrescentam humanas dúvidas em face de contas que totalizam os indevidamente mortos, os que morreram antes do tempo ou os que passaram a viver sem motivo, como o homem que perdeu toda a família e cuja parentela é agora a solidão; ou os que perderam boa parte dos seus e já não sabem o que fazer com o vazio que lhes restou. Os fantasmas de nossas tragédias não entram no censo de nossas repetidas perdas. Se entrassem, este país seria outro e a vida e não o voto teria prioridade nas políticas públicas.

Os desastres naturais revelam muita coisa, na sua súbita ocorrência, nas reações impróprias e improvisadas, fora do roteiro teatral que assegura a eficácia das máscaras dos que poderiam evitar-lhes as consequências. A tragédia não fica explicada no simplismo de uma frase descabida e sem graça dita pelo presidente da República no conforto do Copacabana Palace: "Quando o homem lá em cima fica nervoso e faz chover, só temos a pedir para Ele parar a chuva". É estranha a teologia de Luiz Inácio. A começar pelo fato de que o de "lá de cima" não é homem e o cá de baixo e lá do alto do poder é ele mesmo, que nessa frase se demite dos deveres litúrgicos da função que ocupa neste momento de luto coletivo. O Ser, ao qual atribui a culpa pelo desastre, não é um ente manhoso que sai do sério e castiga pessoas pobres e inocentes, crianças desamparadas por seu capricho e sufocadas pelo mar de lama que não evitou. Luiz Inácio foi convencido, um dia, a trilhar o caminho do poder por catequistas da política que lhe ensinaram que o Ser lá de cima é Deus e, se não me falha a memória, foi-lhe apresentado como o Deus da opção preferencial pelos pobres.

O humor descabido desdobrou-se na politicagem indevida e autodefensiva, fora de hora: "Onde eu vi obras do PAC tem menos água". Mas o conjunto habitacional do PAC inaugurado por Lula e Dilma em Manguinhos, em dezembro, está inundado. Por que, então, o pai do PAC e a mãe do PAC (que sumiu) não tomaram as devidas providências, nesses anos todos de governo, nos lugares há muito conhecidos como "áreas de risco"? Em 2004, quando o prefeito de Niterói era do PT, o Instituto de Geociência da UFF entregou-lhe estudo sobre o alto risco para as moradias no Morro do Bumba, antigo lixão. Os invasores também sabiam do risco. As tragédias dessa ordem têm sido tragédias anunciadas. Por que não removeram antes as vítimas potenciais, não proibiram antes construções e ocupações, não ofereceram alternativas antes que fosse tarde demais? Porque em nossa cultura política populista a razão não traz votos, não adorna mandatos, não confirma o poder.

Os governos federal e estadual e os municipais das áreas atingidas têm funcionários justamente para evitar e prevenir desastres. Por que aparecem depois para enterrar os mortos e não antes para salvar vidas? Desde as enchentes de Santa Catarina, em 2008, este país tem sido colocado em face de adversidades climáticas que questionam uma insólita realidade de omissões sociais e políticas. Cada vez mais os desastres naturais têm sido documentais, porque reveladores do que não se cinge ao clima e à natureza. Acabam solapando os discursos fáceis, as promessas pretensiosas, o politiquismo de boteco. O desastre revela as omissões de décadas de populismo, de que o Rio tem sido vítima preferencial, mais ativo agora nestes tempos eleitorais. Há recursos e investimentos para a marola da Copa de 2014 e da Olimpíada de 2016, mas cadê planos, recursos e competência para corrigir muitos anos de erros e de falta de coragem política no planejamento urbano? Em tudo, a opção pelo supérfluo e o desprezo pelo essencial. Esquerda não é rótulo e de esquerda é o governo que ousa em nome da democrática razão, em nome da vida, e não o governo prisioneiro das passageiras e mansas conveniências do poder.

JOSÉ DE SOUZA MARTINS É PROFESSOR EMÉRITO DA FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DA USP E AUTOR, ENTRE OUTROS LIVROS, DE O CATIVEIRO DA TERRA (CONTEXTO)

A Candidata Pessoa Jurídica

- O Estado de S.Paulo

A população que se acostume: não há hipótese de a ex-ministra Dilma Rousseff, como ela disse e tornou a dizer nos últimos dias, se "desvencilhar" do governo Lula. Isso significa que não há hipótese de a candidata ir para o embate sucessório como uma figura de projeção que, embora fiel ao presidente a quem tudo deve, e leal à administração da qual fez parte desde a primeira hora, tenha identidade própria, propostas próprias ? em suma, vida eleitoral própria. A tática petista de transformar a campanha em um confronto entre o período Fernando Henrique e o atual já não se explica apenas pela expectativa de explorar a grande popularidade de Lula em favor de sua apadrinhada, que ainda não disputou nem uma vaga de síndica, diante de um adversário, o ex-governador José Serra, calejado nas urnas e na atividade pública.

Para o lulismo, a preferência pela disputa plebiscitária ? "nós e eles, pão, pão, queijo, queijo", na memorável descrição do presidente ? tende a ser cada vez mais um imperativo advindo de uma indigesta realidade: a esqualidez aparentemente irremediável do desempenho da candidata, apesar do curso intensivo a que a submetem alguns dos melhores nomes do ramo. À falta de uma Dilma pessoa física, só resta aos seus mentores fazer dela uma pessoa jurídica ? a representação da era Lula.

Naturalmente, o esquema exige descarnar o opositor para criar a ficção de que os nomes à espera do eleitor na urna eletrônica serão, para todos os efeitos, os de dois governos. Daí as tentativas de Dilma de descaracterizar as manifestações do candidato que, diferentemente dela, tem um perfil político estabelecido e fala por si.

Dentro da camisa de força em que as suas limitações e os cálculos plebiscitários dos seus mentores a aprisionaram, a ex-ministra não pode permitir que Serra reconheça méritos neste governo e se proponha a ir em frente ? que é, afinal, o que a população deseja de todos os candidatos. O governador tem de se comportar como os "lobos em pele de cordeiro", que Dilma diz enxergar nos oposicionistas quando defendem a manutenção das políticas sociais de Lula (sem omitir que as suas sementes foram plantadas na gestão que o precedeu). À interdição das opiniões contrárias ao maniqueísmo atrás do qual oculta as suas carências, a candidata acrescenta a mentira pura e simples. Serra ? ela disse isso duas vezes em poucos dias ? é o responsável pelo racionamento de energia em 2001 e 2002, por ter sido ministro do Planejamento de Fernando Henrique ? 6 anos antes, fingiu esquecer.

A súbita agressividade da ex-ministra, na sua ânsia de passar ao público mensagem do gênero "Dilma e Lula, tudo a ver", decerto reflete também o seu visível desconforto ao participar, sem a confortadora companhia do presidente, de eventos preparados para promover a humanização de sua imagem. Nessas horas, temperamento e a lulodependência insatisfeita se combinam para fazê-la tropeçar nas próprias deficiências. O momento crítico é o encontro com a imprensa. Um dia, a ex-prisioneira torturada no regime militar, quando solicitada a comentar as declarações de Lula sobre as greves de fome de dissidentes cubanos, aproveitou para fazer uma comparação infame entre os presos políticos brasileiros. Estes, só a muito custo conseguiram falar com a Anistia Internacional. Já os cubanos, seriam privilegiados, deu a entender, "porque o acesso que eles têm à mídia é muito grande".

Na sua produzida excursão sentimental a Minas, seu Estado natal e segundo maior colégio eleitoral do País, depois de São Paulo, Dilma teve de se haver com uma pergunta sobre as razões que a levaram a começar a sua pré-campanha em "berço tucano", numa alusão ao governo Aécio Neves, do PSDB.

Agressiva, a candidata reagiu então com 4 pedras em cada mão e um disparate na cabeça. "Minas é meu berço, viu? E eu não sou tucana", começou, para emendar: "Tancredo, que eu saiba, também não era tucano. Que eu saiba, Juscelino Kubitschek não era tucano." Ao que se saiba, Juscelino morreu em 1976. Tancredo, em 1985. E o PSDB foi fundado depois, em 1988. Longe de Lula, logo se vê, Dilma é uma autêntica anticandidata. O criador terá de fazer muito mais do que já fez pela criatura.

Honra ao Mérito

Mauro Chaves - O Estado de S.Paulo

A partir de hoje surge a oportunidade de recuperar-se, no País, a valorização do mérito; o gosto de servir das pessoas públicas; a noção de bem comum, de espírito republicano, de direitos humanos - sem os disfarces que não passam de abrigo a intolerâncias -; o insubstituível esforço do aprendizado; a lealdade, a solidariedade, a confiança no outro; a recusa ao uso da violência para a imposição de ideias; o respeito à bela língua portuguesa; o repúdio a baixar-se o nível intelectual e cultural para ficar-se no nível do chefe - e fingindo julgá-lo o maior dos sábios -; a majestade do cargo de comando maior da República, escoimando-o de chulices e vulgaridades; o respeito à Justiça, sem dar-se o exemplo de escárnio a suas decisões; a deferência e o apreço às instituições do Estado, aos Poderes da República - dando tratamento digno aos representantes do povo no Parlamento, sem forçar senadores da República a dormir pensando numa coisa e acordar pensando em outra -, à classe política - pelo entendimento de que política é uma atividade nobre, exercida por pessoas honestas, e não um valhacouto de bandidos -; o estímulo à harmonia entre as unidades da Federação - e não à disputa entre Estados e regiões do País, criando ou reavivando rivalidades e conflitos entre populações pacíficas e solidárias desde o Império - ou entre os diversos grupos sociais, ou entre as diferentes formas de convicção, crença e opinião; o apoio à plena liberdade de expressão - sem a qual os regimes políticos não passam de farsas democráticas -; a rejeição ao silêncio e à cumplicidade em relação a malfeitos de companheiros, correligionários e apaniguados; a coragem de se opor aos que desobedecem às leis e reconhecem privilégios de impunidade usufruídos por pessoas não pertencentes à mera categoria de cidadãos comuns; o respeito aos presos políticos - não os comparando aos bandidos comuns -; a demonstração de afinidade do País com os regimes democráticos, e não com as ditaduras de nosso continente ou de outras partes do mundo; a defesa dos interesses do Brasil nas negociações internacionais - deixando de ceder em tudo e sempre favorecer aos interesses dos concorrentes -; os investimentos reais em educação, concentrados na qualidade do ensino, premiando o aperfeiçoamento profissional dos professores, e não destinados à proliferação de ignorantes diplomados; a reversão de um esvaziamento mental geral, que faz até as letras dos jovens compositores se tornarem repetitivas, pouco imaginativas, chapadas, fruto de um arsenal cultural cada vez mais encolhido e da aceitação cada vez maior da mediocridade; a escolha de pessoas competentes para a administração pública, que conheçam de fato a área de governo que se dispõem a dirigir - em contraste com o aparelhamento e inchaço da máquina pública com companheiros políticos sem nenhuma qualificação técnica para a função -; o uso austero das facilidades e mordomias postas à disposição dos governantes, tais como meios especiais de transporte, abastecimento de residências, uso doméstico de servidores públicos - sem deixar-se que esse uso se torne abuso das famílias, dos amigos das famílias e dos amigos dos amigos das famílias dos que exercem o Poder maior -; o exemplo de parcimônia, seriedade, eficiência e compostura dado à sociedade, para que o dispendioso desleixo comportamental não seja tomado como modelo geral de sucesso na vida, na substituição do esforço pela esperteza, dos que não veem vantagem alguma no conhecimento, na aptidão real e na seriedade laboral, se a qualidade dos serviços não é compensada - nem a falta de qualidade é cobrada - desde a mais alta cúpula governamental; o respeito ao direito constitucional à propriedade, aos meios legítimos de produção, sem permitir o esbulho, as depredações e os vandalismos praticados por grupos fora da legalidade que se arvoram em representantes autênticos de "movimentos sociais"; o incentivo ao verdadeiro sindicalismo, aos sindicatos e centrais independentes, defensores dos reais interesses das categorias profissionais, e não do peleguismo chapa-branca, subsidiado com polpudos recursos lhes repassados compulsoriamente pelos que trabalham, assim como as fartas verbas públicas calam e compram a cumplicidade dos que já tiveram a coragem cívica dos caras-pintadas; o combate ao descarado tráfico de influência, praticado até por políticos com mandato cassado que obtêm consultorias milionárias para negócios com estatais, que os tornam figuras badaladas do jet set internacional; o combate à prática das chantagens, dos falsos dossiês; a valorização do conteúdo das palavras, com a abolição do já arraigado costume do "dito pelo não dito" no espaço público-político; o rubor na face ante as evidências flagrantes e exuberantes das falcatruas, ou a vergonha na cara, que impeça o cinismo de se tornar o indício maior de talento na articulação política e na comunicação marqueteira; a exigência de que as empresas respeitem efetivamente os direitos do consumidor, especialmente naquilo que se refere a seu bem mais precioso - que é sua saúde e sua vida -, e, da mesma forma, as entidades governamentais respeitem os cidadãos-contribuintes, cuja parcela substancial de esforço de trabalho as sustenta; a revitalização de conceitos que pretenderam, nos últimos anos, jogar na lata do lixo da obsolescência, tais como o da lisura, o dos princípios, o dos escrúpulos, o do patriotismo, o da liberdade, o do caráter, o do brio, o da honra.

Sim, neste sábado pode estar começando no Brasil o processo de recuperação da honra ao mérito.


Jornalista, Advogado, Escritor, Administrador de Empresas e Pintor. E-mail: mauro.chaves@attglobal.net (WWW.ARTESTUDIOMAUROCHAVES.WORDPRESS.COM)

O Brasil Pode Mais

Discurso de José Serra no encontro partidário de ontem. Estamos no caminho certo.

10/04/2010 - 11h08m

“Venho hoje, aqui, falar do meu amor pelo Brasil; falar da minha vida; falar da minha experiência; falar da minha fé; falar das minhas esperanças no Brasil. E mostrar minha disposição de assumir esta caminhada. Uma caminhada que vai ser longa e difícil mas que com a ajuda de Deus e com a força do povo brasileiro será com certeza vitoriosa.

Alguns dias atrás, terminei meu discurso de despedida do Governo de São Paulo afirmando minha convicção de que o Brasil pode mais. Quatro palavras, em meio a muitas outras. Mas que ganharam destaque porque traduzem de maneira simples e direta o sentimento de milhões de brasileiros: o de que o Brasil, de fato, pode mais. E é isto que está em jogo nesta hora crucial!

Nos últimos 25 anos, o povo brasileiro alcançou muitas conquistas: retomamos a Democracia, arrancamos nas ruas o direito de votar para presidente, vivemos hoje num país sem censura e com uma imprensa livre. Somos um Estado de Direito Democrático.

Fizemos uma nova Constituição, escrita por representantes do povo. Com o Plano Real, o Brasil transformou sua economia a favor do povo, controlou a inflação, melhorou a renda e a vida dos mais pobres, inaugurou uma nova Era no Brasil.

Também conquistamos a responsabilidade fiscal dos governos. Criamos uma agricultura mais forte, uma indústria eficiente e um sistema financeiro sólido. Fizemos o Sistema Único de Saúde, conseguimos colocar as crianças na escola, diminuímos a miséria, ampliamos o consumo e o crédito, principalmente para os brasileiros mais pobres.

Tudo isso em 25 anos. Não foram conquistas de um só homem ou de um só Governo, muito menos de um único partido. Todas são resultado de 25 anos de estabilidade democrática, luta e trabalho. E nós somos militantes dessa transformação, protagonistas mesmo, contribuímos para essa história de progresso e de avanços do nosso País. Nós podemos nos orgulhar disso.

Mas, se avançamos, também devemos admitir que ainda falta muito por fazer. E se considerarmos os avanços em outros países e o potencial do Brasil, uma conclusão é inevitável: o Brasil pode ser muito mais do que é hoje.

Mas para isso temos de enfrentar os problemas nacionais e resolvê-los, sem ceder à demagogia, às bravatas ou à politicagem. E esse é um bom momento para reafirmarmos nossos valores.

Começando pelo apreço à Democracia Representativa, que foi fundamental para chegarmos aonde chegamos. Devemos respeitá-la, defendê-la, fortalecê-la. Jamais afrontá-la.

Democracia e Estado de Direito são valores universais, permanentes, insubstituíveis e inegociáveis. Mas não são únicos. Honestidade, verdade, caráter, honra, coragem, coerência, brio profissional, perseverança são essenciais ao exercício da política e do Poder.

É nisso que eu acredito e é assim que eu ajo e continuarei agindo. Este é o momento de falar claro, para que ninguém se engane sobre as minhas crenças e valores. É com base neles que também reafirmo: o Brasil, meus amigos e amigas, pode mais.

Governos, como as pessoas, têm que ter alma. E a alma que inspira nossas ações é a vontade de melhorar a vida das pessoas que dependem do estudo e do trabalho, da Saúde e da Segurança. Amparar os que estão desamparados.

Sabem quantas pessoas com alguma deficiência física existem no Brasil? Mais de 20 milhões – a esmagadora maioria sem o conforto da acessibilidade aos equipamentos públicos e a um tratamento de reabilitação. Os governos, como as pessoas, têm que ser solidários com todos e principalmente com aqueles que são mais vulneráveis.

Quem governa, deve acreditar no planejamento de suas ações. Cultivar a austeridade fiscal, que significa fazer melhor e mais com os mesmos recursos. Fazer mais do que repetir promessas.

O governo deve ouvir a voz dos trabalhadores e dos desamparados, das mulheres e das famílias, dos servidores públicos e dos profissionais de todas as áreas, dos jovens e dos idosos, dos pequenos e dos grandes empresários, do mercado financeiro, mas também do mercado dos que produzem alimentos, matérias-primas, produtos industriais e serviços essenciais, que são o fundamento do nosso desenvolvimento, a máquina de gerar empregos, consumo e riqueza.

O governo deve servir ao povo, não a partidos e a corporações que não representam o interesse público. Um governo deve sempre procurar unir a nação. De mim, ninguém deve esperar que estimule disputas de pobres contra ricos, ou de ricos contra pobres. Eu quero todos, lado a lado, na solidariedade necessária à construção de um país que seja realmente de todos.

Ninguém deve esperar que joguemos estados do Norte contra estados do Sul, cidades grandes contra cidades pequenas, o urbano contra o rural, a indústria contra os serviços, o comércio contra a agricultura, azuis contra vermelhos, amarelos contra verdes. Pode ser engraçado no futebol. Mas não é quando se fala de um País. E é deplorável que haja gente que, em nome da política, tente dividir o nosso Brasil.

Não aceito o raciocínio do nós contra eles. Não cabe na vida de uma Nação. Somos todos irmãos na pátria. Lutamos pela união dos brasileiros e não pela sua divisão. Pode haver uma desavença aqui outra acolá, como em qualquer família. Mas vamos trabalhar somando, agregando. Nunca dividindo. Nunca excluindo.

O Brasil tem grandes carências. Não pode perder energia com disputas entre brasileiros. Nunca será um país desenvolvido se não promover um equilíbrio maior entre suas regiões. Entre a nossa Amazônia, o Centro Oeste e o Sudeste. Entre o Sul e o Nordeste.

Por isso, conclamo: Vamos juntos. O Brasil pode mais. O desenvolvimento é uma escolha. E faremos essa escolha. Estamos preparados para isso.

Ninguém deve esperar que joguemos o governo contra a oposição, porque não o faremos. Jamais rotularemos os adversários como inimigos da pátria ou do povo. Em meio século de militância política nunca fiz isso. E não vou fazer. Eu quero todos juntos, cada um com sua identidade, em nome do bem comum.

Na Constituinte fiz a emenda que permitiu criar o FAT, financiar e fortalecer o BNDES e tirar do papel o seguro-desemprego – que hoje beneficia 10 milhões de trabalhadores. Todos os partidos e blocos a apoiaram.

No ministério da Saúde do governo Fernando Henrique tomei a iniciativa de enviar ou refazer e impulsionar seis projetos de lei e uma emenda constitucional – a criação da Agência Nacional de Vigilância Sanitária e da Agência Nacional de Saúde, a implantação dos genéricos, a proibição do fumo nos aviões e da propaganda de cigarros, a regulamentação dos planos de saúde, o combate à falsificação de remédios e a PEC 29, que vinculou recursos à Saúde nas três esferas da Federação - todos, sem exceção, aprovados pelos parlamentares do governo e da oposição.

É assim que eu trabalho: somando e unindo, visando ao bem comum. Os membros do Congresso que estão me ouvindo, podem testemunhar: suas emendas ao orçamento da Saúde eram acolhidas pela qualidade, nunca devido à sua filiação partidária.

Se o povo assim decidir, vamos governar com todas e com todos, sem discriminar ninguém. Juntar pessoas em vez de separá-las; convidá-las ao diálogo, em vez de segregá-las; explicar os nossos propósitos, em vez de hostilizá-las. Vamos valorizar o talento, a honestidade e o patriotismo em vez de indagar a filiação partidária.

Minha história de vida e minhas convicções pessoais sempre estiveram comprometidas com a unidade do país e com a unidade do seu povo. Sou filho de imigrantes, morei e cresci num bairro de trabalhadores que vinham de todas as partes, da Europa, do Nordeste, do Sul. Todos em busca de oportunidade e de esperança.

A liderança no movimento estudantil me fez conhecer e conviver com todo o Brasil logo ao final da minha adolescência. Aliás, na época, aprendi mesmo a fazer política no Rio, em Minas, na Bahia e em Pernambuco, aos 21 anos de idade. O longo exílio me levou sempre a enxergar e refletir sobre o nosso país como um todo.

Minha história pessoal está diretamente vinculada à valorização do trabalho, à valorização do esforço, à valorização da dedicação. Lembro-me do meu pai, um modesto comerciante de frutas no mercado municipal: doze horas de jornada de trabalho nos dias úteis, dez horas no sábado, cinco horas aos domingos. Só não trabalhava no dia 1 de janeiro. Férias? Um luxo, pois deixava de ganhar o dinheiro da nossa subsistência.

Um homem austero, severo, digno. Seu exemplo me marcou na vida e na compreensão do que significa o amor familiar de um trabalhador: ele carregava caixas de frutas para que um dia eu pudesse carregar caixas de livros.

E eu me esforço para tornar digno o trabalho de todo homem e mulher, do ser humano como ele foi. Porque vejo a imagem de meu pai em cada trabalhador. Eu a vi outro dia, na inauguração do Rodoanel, quando um dos operários fez questão de me mostrar com orgulho seu nome no mural que eu mandei fazer para exibir a identidade de todos os trabalhadores que fizeram aquela obra espetacular.

Por que o mural? Por justo reconhecimento e porque eu sabia que despertaria neles o orgulho de quem sabe exercer a profissão. Um momento de revelação a si mesmos de que eles são os verdadeiros construtores nesta nação.

Eu vejo em cada criança na escola o menino que eu fui, cheio de esperanças, com o peito cheio de crença no futuro. Quando prefeito e quando governador, passei anos indo às escolas para dar aula (de verdade) à criançada da quarta série. Ia reencontrar-me comigo mesmo. Porque tudo o que eu sou aprendi em duas escolas: a escola pública e a escola da vida pública.

Aliás, e isto é um perigo dizer, com freqüência uso senhas de computador baseadas no nome de minhas professoras no curso primário. E toda vez que escrevo lembro da sua fisionomia, da sua voz, do seu esforço, e até das broncas, de um puxão de orelhas, quando eu fazia alguma bagunça.

Mas é por isso tudo que sempre lutei e luto tanto pela educação dos milhões de filhos do Brasil. No país com que sonho para os meus netos, o melhor caminho para o sucesso e a prosperidade será a matrícula numa boa escola, e não a carteirinha de um partido político. E estou convencido de uma coisa: bons prédios, serviços adequados de merenda, transporte escolar, atividades esportivas e culturais, tudo é muito importante e deve ser aperfeiçoado. Mas a condição fundamental é a melhora do aprendizado na sala de aula, propósito bem declarado pelo governo, mas que praticamente não saiu do papel.

Serão necessários mais recursos. Mas pensemos no custo para o Brasil de não ter essa nova Educação em que o filho do pobre freqüente uma escola tão boa quanto a do filho do rico. Esse é um compromisso.

É preciso prestar atenção num retrocesso grave dos últimos anos: a estagnação da escolaridade entre os adolescentes. Para essa faixa de idade, embora não exclusivamente para ela, vamos turbinar o ensino técnico e profissional, aquele que vira emprego. Emprego para a juventude, que é castigada pela falta de oportunidades de subir na vida. E vamos fazer de forma descentralizada, em parcerias com estados e municípios, o que garante uma vinculação entre as escolas técnicas e os mercados locais, onde os empregos são gerados.

Ensino de qualidade e de custos moderados, que nos permitirá multiplicar por dois ou três o número de alunos no país inteiro, num período de governo. Sim, meus amigos e amigas, o Brasil pode mais.

Podemos e devemos fazer mais pela saúde do nosso povo.

O SUS foi um filho da Constituinte que nós consolidamos no governo passado, fortalecendo a integração entre União, Estados e Municípios; carreando mais recursos para o setor; reduzindo custos de medicamentos; enfrentando com sucesso a barreira das patentes, no Brasil e na Organização Mundial do Comércio; ampliando o sistema de atenção básica e o Programa Saúde da Família em todo o Brasil; prestigiando o setor filantrópico sério, com quem fizemos grandes parcerias, dos hospitais até a prevenção e promoção da Saúde, como a Pastoral da Criança; fazendo a melhor campanha contra a AIDS do mundo em desenvolvimento; organizando os mutirões; fazendo mais vacinações; ampliando a assistência às pessoas com deficiência; cerceando o abuso do incentivo ao cigarro e ao tabaco em geral. E muitas outras coisas mais.

De fato, e mais pelo que aconteceu na primeira metade do governo, a Saúde estagnou ou avançou pouco. Mas a Saúde pode avançar muito mais. E nós sabemos como fazer isso acontecer.

Saúde é vida, Segurança também. Por isso, o governo federal deve assumir mais responsabilidades face à gravidade da situação. E não tirar o corpo fora porque a Constituição atribui aos governos estaduais a competência principal nessa área.

Tenho visto gente criticar o Estado Mínimo, o Estado Omisso. Concordo. Por isso mesmo, se tem área em que o Estado não tem o direito de ser mínimo, de se omitir, é a segurança pública. As bases do crime organizado estão no contrabando de armas e de drogas, cujo combate efetivo cabe às autoridades federais. Ou o governo federal assume de vez, na prática, a coordenação efetiva dos esforços nacionalmente, ou o Brasil não tem como ganhar a guerra contra o crime e proteger nossa juventude.

Qual pai ou mãe de família não se sente ameaçado pela violência, pelo tráfico e pela difusão do uso das drogas? As drogas são hoje uma praga nacional. E aqui também o Governo tem de investir em clínicas e programas de recuperação para quem precisa e não pode ser tolerante com traficantes da morte. Mais ainda se o narcotráfico se esconde atrás da ideologia ou da política. Os jovens são as grandes vítimas. Por isso mesmo, ações preventivas, educativas, repressivas e de assistência precisam ser combinadas com a expansão da qualificação profissional e a oferta de empregos.

Uma coisa que precisa acabar é a falsa oposição entre construir escolas e construir presídios. Muitas vezes, essa é a conversa de quem não faz nem uma coisa nem outra. É verdade que nossos jovens necessitam de boas escolas e de bons empregos, mas se o indivíduo comete um crime ele deve ser punido. Existem propostas de impor penas mais duras aos criminosos. Não sou contra, mas talvez mais importante do que isso seja a garantia da punição.

O problema principal no Brasil não são as penas supostamente leves. É a quase certeza da impunidade. Um país só tem mais chance de conseguir a paz quando existe a garantia de que a atitude criminosa não vai ficar sem castigo.

Eu quero que meus netos cresçam num país em que as leis sejam aplicadas para todos. Se o trabalhador precisa cumprir a lei, o prefeito, o governador e o presidente da República também tem essa obrigação. Em nosso país, nenhum brasileiro vai estar acima da lei, por mais poderoso que seja. Na Segurança e na Justiça, o Brasil também pode mais.

Lembro que os investimentos governamentais no Brasil, como proporção do PIB, ainda são dos mais baixos do mundo em desenvolvimento. Isso compromete ou encarece a produção, as exportações e o comércio.

Há uma quase unanimidade a respeito das carências da infra-estrutura brasileira: no geral, as estradas não estão boas, faltam armazéns, os aeroportos vivem à beira do caos, os portos, por onde passam nossas exportações e importações, há muito deixaram de atender as necessidades. Tem gente que vê essas carências apenas como um desconforto, um incômodo. Mas essa é uma visão errada. O PIB brasileiro poderia crescer bem mais se a infra-estrutura fosse adequada, se funcionasse de acordo com o tamanho do nosso país, da população e da economia.

Um exemplo simples: hoje, custa mais caro transportar uma tonelada de soja do Mato Grosso ao porto de Paranaguá do que levar a mesma soja do porto brasileiro até a China. Um absurdo. A conseqüência é menos dinheiro no bolso do produtor, menos investimento e menos riqueza no interior do Brasil. E sobretudo menos empregos.

Temos inflação baixa, mais crédito e reservas elevadas, o que é bom, mas para que o crescimento seja sustentado nos próximos anos não podemos ter uma combinação perversa de falta de infra-estrutura, inadequações da política macroeconômica, aumento da rigidez fiscal e vertiginoso crescimento do déficit do balanço de pagamentos. Aliás, o valor de nossas exportações cresceu muito nesta década, devido à melhora dos preços e da demanda por nossas matérias primas. Mas vai ter de crescer mais.

Temos de romper pontos de estrangulamento e atuar de forma mais agressiva na conquista de mercados. Vejam que dado impressionante: nos últimos anos, mais de 100 acordos de livre comércio foram assinados em todo o mundo. São um instrumento poderoso de abertura de mercados. Pois o Brasil, junto com o MERCOSUL, assinou apenas um novo acordo (com Israel), que ainda não entrou em vigência!

Da mesma forma, precisamos tratar com mais seriedade a preservação do meio-ambiente e o desenvolvimento sustentável. Repito aqui o que venho dizendo há anos: é possível, sim, fazer o país crescer e defender nosso meio ambiente, preservar as florestas, a qualidade do ar a contenção das emissões de gás carbônico. É dever urgente dar a todos os brasileiros saneamento básico, que também é meio ambiente. Água encanada de boa qualidade, esgoto coletado e tratado não são luxo. São essenciais. São Saúde. São cidadania.

A economia verde é, ao contrário do que pensam alguns, uma possibilidade promissora para o Brasil. Temos muito por fazer e muito o que progredir, e vamos fazê-lo.

Também não são incompatíveis a proteção do meio ambiente e o dinamismo extraordinário de nossa agricultura, que tem sido a galinha de ovos de ouro do desenvolvimento do país, produzindo as alimentos para nosso povo, salvando nossas contas externas, contribuindo para segurar a inflação e ainda gerar energia! Estou convencido disso e vamos provar o acerto dessa convicção na prática de governo. Sabem por quê? Porque sabemos como fazer e porque o Brasil pode mais!

O Brasil está cada vez maior e mais forte. É uma voz ouvida com respeito e atenção. Vamos usar essa força para defender a autodeterminação dos povos e os direitos humanos, sem vacilações.

Eu fui perseguido em dois golpes de estado, tive dois exílios simultâneos, do Brasil e do Chile. Sou sobrevivente do Estádio Nacional de Santiago, onde muitos morreram. Por algum motivo, Deus permitiu que eu saísse de lá com vida.

Para mim, direitos humanos não são negociáveis. Não cultivemos ilusões: democracias não têm gente encarcerada ou condenada à forca por pensar diferente de quem está no governo. Democracias não têm operários morrendo por greve de fome quando discordam do regime.

Nossa presença no mundo exige que não descuidemos de nossas Forças Armadas e da defesa de nossas fronteiras. O mundo contemporâneo é desafiador. A existência de Forças Armadas treinadas, disciplinadas, respeitadoras da Constituição e das leis foi uma conquista da Nova República. Precisamos mantê-las bem equipadas, para que cumpram suas funções, na dissuasão de ameaças sem ter de recorrer diretamente ao uso da força e na contribuição ao desenvolvimento tecnológico do país.

Como falei no início, esta será uma caminhada longa e difícil. Mas manteremos nosso comportamento a favor do Brasil.

Às provocações, vamos responder com serenidade; às falanges do ódio que insistem em dividir a nação vamos responder com nosso trabalho presente e nossa crença no futuro. Vamos responder sempre dizendo a verdade. Aliás, quanto mais mentiras os adversários disserem sobre nós, mais verdades diremos sobre eles.

O Brasil não tem dono. O Brasil pertence aos brasileiros que trabalham; aos brasileiros que estudam; aos brasileiros que querem subir na vida; aos brasileiros que acreditam no esforço; aos brasileiros que não se deixam corromper; aos brasileiros que não toleram os malfeitos; aos brasileiros que não dispõem de uma “boquinha”; aos brasileiros que exigem ética na vida pública porque são decentes; aos brasileiros que não contam com um partido ou com alguma maracutaia para subir na vida.

Este é o povo que devemos mobilizar para a nossa luta; este é o povo que devemos convocar para a nossa caminhada; este é o povo que quer, porque assim deve ser, conservar as suas conquistas, mas que anseia mais. Porque o Brasil, meus amigos e amigas, pode mais. E, por isso, tem de estar unido. O Brasil é um só.

Pretendo apresentar ao Brasil minha história e minhas idéias. Minha biografia. Minhas crenças e meus valores. Meu entusiasmo e minha confiança. Minha experiência e minha vontade.

Vou lhes contar uma coisa. Desde cedo, quando entrei na vida pública, descobri qual era a motivação maior, a mola propulsora da atividade política. Para mim, a motivação é o prazer. A vida pública não é sacrifício, como tantos a pintam, mas sim um trabalho prazeroso. Só que não é o mero prazer do desfrute. É o prazer da frutificação. Não é um sonho de consumo. É um sonho de produção e de criação.

Aprendi desde cedo que servir é bom, nos faz felizes, porque nos dá o sentido maior de nossas existências, porque nos traz uma sensação de bem estar muito mais profunda do que quaisquer confortos ou vantagens propiciados pelas posições de Poder. Aprendi que nada se compara à sensação de construir algo de bom e duradouro para a sociedade em que vivemos, de descobrir soluções para os problemas reais das pessoas, de fazer acontecer.

O grande escritor mineiro Guimarães Rosa, escreveu: O correr da vida embrulha tudo. A vida é assim: esquenta e esfria, aperta e daí afrouxa, sossega e depois desinquieta. O que ela quer da gente é coragem. Concordo. É da coragem que a vida quer que nós precisamos agora. Coragem para fazer um projeto de País, com sonhos, convicções e com o apoio da maioria.

Juntos, vamos construir o Brasil que queremos, mais justo e mais generoso. Eleição é uma escolha sobre o futuro. Olhando pra frente, sem picuinhas, sem mesquinharias, eu me coloco diante do Brasil, hoje, com minha biografia, minha história política e com . esperança no nosso futuro. E determinado a fazer a minha parte para construir um Brasil melhor.

Quero ser o presidente da união. Vamos juntos, brasileiros e brasileiras, porque o Brasil pode mais.”