Tuesday, February 06, 2007

Como a economia reage a um ataque terrorista?

The Economist
05/02/2007

A economia é uma profissão chocante. Não que os economistas sejam incompetentes, trabalhem em meio à sujeira ou tenham hábitos repulsivos. "Chocante" é o que ele fazem. Eles partem de um modelo da economia, administram um choque a ela - por exemplo, um súbito aumento no preço do petróleo, algum avanço tecnológico ou uma eliminação de tarifas - e examinam o que acontece com a produção, preços, emprego etc.

Imagine um salto nos preços do petróleo: a produção cai, os preços sobem; dependendo das expectativas inflacionárias e da reação do banco central, pode se seguir uma persistente onda inflacionária. Introduza alguns números plausíveis nos lugares certos, use algumas estatísticas sofisticadas e aplique uma boa dose de processamento de dados e você poderá estimar a dimensão dos efeitos.

Quase todos esses exercícios envolvem, na verdade, mudanças na média de um número ou de um valor esperado (em jargão estatístico, o "primeiro momento" de sua distribuição de probabilidades): e se o preço do petróleo dobrar? Mas os economistas dedicam pouco tempo calculando o que ocorrerá se o mundo tornar-se mais incerto: e se o preço do petróleo provavelmente ficar na faixa de, digamos, US$ 20 a US$ 100 em vez de entre US$ 50 e US$ 60? Indagações desse tipo (sobre o "segundo momento") são certamente mais difíceis de responder - os cálculos matemáticos são mais complicados, porém mesmo assim importantes.



E são importantes em parte pela simples razão de que o comportamento das pessoas pode mudar se o mundo subitamente se tornar um lugar com menos (ou mais) certezas. Além disso, destaca Nick Bloom, economista britânico na Universidade Stanford, eventos que elevam a incerteza, medida pela volatilidade dos preços de ações de empresas americanas, são relativamente freqüentes. O mais evidente exemplo recente de um grande choque de segundo momento foram os ataques terroristas de 11 de setembro de 2001; mas houve outros nas últimas décadas, do assassinato de John Kennedy ao colapso da fundo americano Long-Term Capital Management e da Enron (veja gráfico).
Os economistas não se deixaram intimidar por choques de segundo momento. Com efeito, em 1983 um jovem economista americano chamado Ben Bernanke publicou uma análise examinando como os investimentos seriam afetados por incertezas. Incertezas, disse ele, podem resultar num incremento do lucro das empresas - em conseqüência de um adiamento, em vez da realização imediata, de um investimento irreversível.
Bloom revisitou o tema com um tratamento mais aprofundado, viabilizado pelas modernas técnicas de modelagem e ferramentas de computação. Num estudo apresentado no mês passado à reunião anual da Associação Econômica Americana (AEA), em Chicago, ele descreve um modelo no qual as empresas decidem quanto investir e quantos trabalhadores empregar. O mundo no qual elas operam é incerto, no sentido de que suas receitas podem variar. Ele introduz um "choque de incerteza" no modelo com a premissa de que a variabilidade das receitas das empresas sobe repentinamente - usando dados de choque ocorridos ao longo dos últimos 45 anos, ele supõe que o desvio padrão, uma medida estatística de variabilidade, dobre antes de voltar a seu antigo nível no prazo de poucos meses.
O modelo prevê, assim como a análise de Bernanke, que as empresas esperam para ver o que vai acontecer. Em virtude de o futuro ser menos definido, a chance de que a demanda venha a ser muito baixa (ou muito alta) é maior. O valor da espera, portanto, aumenta. As empresas que de outra forma teriam ampliado seus investimentos ou contratado mais trabalhadores adiam seus planos. Por outro lado, as empresas que vinham encolhendo adiam as decisões de corte de pessoal. Mas o efeito líquido é que investimento e emprego diminuem. A produtividade também cai: devido ao adiamento de contratações e de cortes de pessoal, os trabalhadores deixam de ser remanejados de empresas menos produtivas para outras, mais produtivas. À medida que a incerteza volta aos níveis normais, há uma retomada dos investimentos, emprego e produtividade.
Bloom acredita que seu modelo reproduz razoavelmente bem o que aconteceu no período após os ataques em 11 de setembro. O crescimento líquido do emprego nos EUA caiu sensivelmente nos três meses após os ataques - a julgar pelas estimativas de economistas de meados de agosto, havia 1 milhão de empregos a menos do que o esperado para o fim do ano - mas registrou uma recuperação no primeiro trimestre de 2002. Os investimentos também diminuíram e se recuperaram. A percepção de que a incerteza cresceu transparece ainda nas atas de reuniões do banco central à época. Uma autoridade comentou que algumas famílias e empresas estão entrando em "compasso de espera... Estão pondo em banho-maria suas decisões de gastos de capital".
Para as autoridades monetárias, diz Bloom, é importante distinguir choques de segundo momento, que parecem não durar muito, de choques de primeiro momento, cujos efeitos são mais duradouros. Se o banco central errar e considerar um crescimento temporário da incerteza como um choque permanente, ele pode, por exemplo, cortar os juros mais do que deveria, com resultados inflacionários. Para tornar as coisas mais difíceis, choques de primeiro e de segundo momentos provavelmente acontecem simultaneamente.
Bloom acredita que o Fed e outros bancos centrais reagiram inteligentemente aos ataques de 11 de setembro. Ainda assim, sugere o exame de algumas informações que podem ajudar a distinguir os dois tipos de choques. Em primeiro lugar, um brusco aumento na volatilidade do mercado acionário é um sinal de maior incerteza. Em seguida, os diferentes tipos de choques devem produzir efeitos distintos nas empresas. Um forte choque de primeiro momento reduz as atividades de todas as empresas. Mas um aumento da incerteza que faça com que todas as empresas ponham seus planos em banho-maria paralisará (ou desacelerará) o crescimento das empresas que estão crescendo, mas fortalecerá as empresas que estão se contraindo.
Choques de incerteza são sempre transitórios? Quase sempre. Nenhum dos exemplos (veja gráfico) durou muito. No século passado, Bloom distingue só um episódio assim: a Grande Depressão. Entre 1929 e 1932, a volatilidade média nas bolsas foi 30% maior que após os ataques de 2001. O prolongado surto de incerteza (agravado por más decisões de política monetária) conteve o "espírito animal" no qual John Maynard Keynes tanto apostava, com efeitos catastróficos sobre investimentos e nível de emprego. As conseqüências macroeconômicas diretas do 11 de setembro, apesar de todo o terror letal, foram muito mais breves.

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